Lembram-se de Memento, o thriller psicológico de Christopher Nolan que lhe valeu as primeiras duas nomeações aos Oscars – e que deixou muito boa gente com a cabeça à roda, rebobinando a fita para ver tudo outra vez? Pois bem, “Apesar de Tudo” (Arte de Autor, 2021) está longe de atingir os índices de loucura de “Memento” mas, tal como este, subverte a linha temporal para contar uma história de amor platónico com quatro décadas de marinanço.
“Apesar de Tudo” foi a estreia do barcelonês Jordi Lafebre no mercado franco-belga, isto após diversos trabalhos publicados com o argumento de Zidrou. Por cá, a Arte de Autor tem vindo a publicar, desta dupla, a série “Verões Felizes”, uma das mais recomendadas para apreciadores de banda desenhada com pelo menos uma costela franco-belga.
Se fosse um filme, “Apesar de Tudo” seria uma comédia romântica, provavelmente com Hugh Grant a triunfar no casting para o papel de Zeno, um espírito livre que trocou, a certa altura, a calmaria pela inquietação. Para as velhas solteironas – ou viúvas -, Zeno é “o celibatário mais sedutor da cidade“. O seu amor dá pelo nome de Ana, uma muito focada – e casada – Presidente de Câmara, quase a arrumar as botas e a dar lugar a (mais) um político incompetente.
Jordi Lafebre arranca do momento presente, recuando em cada um dos capítulos alguns anos na linha temporal para mergulhar nesta relação com muito platonismo, algum respeito pelas convenções e uma boa dose de subversão dos costumes – ainda que às escondidas – à mistura, tudo para mostrar que a tese nunca provada de Zeno, também doutorado em física, poderá fazer algum sentido: partindo do conceito de entropia, se uma força fosse capaz de suspender o tempo tudo se reordenaria e poder-se-ia voltar atrás no tempo. Ou, quem sabe, dar a volta ao platonismo.
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