É, já o escrevemos por aqui muitas vezes, uma das mais entusiasmantes séries com o selo da Image, que junta um trio de acompanhantes de luxo: Jeff Lemire (argumento), Andrea Sorrentino (desenhos) e Dave Stewart (cores) – não esquecendo Steve Wands, o responsável pelo projecto gráfico de Gideon Falls – Prémio Eisner para Melhor Nova Série em 2019 -, que chega a bom fim com a publicação do sexto álbum: “O Fim” (G. Floy, 2022).
Onde será o “para casa” a que o padre Fred – agora ao estilo de Shwarzenneger em Terminator – se refere, lugar onde estarão Norton e todos os outros? E como irá Daniel dar conta das andanças da parentalidade? Estas são algumas das questões com que é lançado este número derradeiro, do qual o leitor não deverá ter grandes esperanças de sair com a sanidade reforçada. Veja-se, por exemplo, esta tirada sobre Angela Xu: “Conhecemos. Conhecíamos. Ela acabou de morrer. Mas deve estar quase a voltar”.
Quem diria que, chegados a este ponto, a solução para dar conta do Homem Sorridente e das suas legiões do mal poderia passar por reconstruir o Celeiro Negro? A ansiedade dos volumes anteriores concentra-se neste derradeiro frente-a-frente, onde por várias vezes o leitor dará a pensar em Stranger Things, sobretudo naquele final que nos transporta para o final da primeira temporada – ainda que, ao pé disto, o Stranger Things seja (bom) entretenimento para meninos. O Kritch Kritch ecoa da primeira à última página e, se quisermos retirar algum ensinamento de toda esta insanidade, talvez possa ser isto: o mal – e a negra voz interior – está sempre à espreita.
Para fechar em grande esta história onde tudo converge para o centro, este volume final vem apetrechado de extras suficientes para vencer um campeonato de tunning dos comics: o guião final, em inglês; uma espécie de guia ilustrado sobre o funcionamento interno de Gideon Falls; capas diversas; ou pistas para o futuro, dirigidas a quem quer que a aventura não fique por aqui: “Há muita coisa que nunca explorámos realmente desta estrutura muito complexa, mas talvez haja tempo em futuros projectos”.
Mas a coisa não fica por aqui. Há ainda um texto, assinado por Jeff Lemire, sobre a génese de Gideon Falls, onde revela que tudo começou no lixo – e com uma curta-metragem. Este foi, na verdade, o primeiro comics de Lemire, alvo de constantes revisitações, versões e inquietações ao longo do tempo. “Escrever o Gideon Falls e ver a espantosa arte do Andrea Sorrentino todas as semanas tem sido o ponto alto da minha carreira. Foi um dos livros em que tive mais prazer de trabalhar. Tudo fluía. Nunca foi uma luta”, escreve Lemire, antes de nos presentear com a partilha inesperada do “primeiro capítulo da minha primeira tentativa de comic”, onde assistimos ao nascimento daquilo que seria Norton Sinclair. “Era apenas um tipo de 22 anos a lutar para pagar a renda e a lutar contra a depressão e sobreviver aos dias”. Para os fãs de Lemire, esta é sem dúvida uma edição histórica.
Sem Comentários