Num livro tripartido onde a figura central é a jovem Miranda – alter-ego de Katherine Anne Porter -, somos confrontados com um trio de contos que nos remete para um passado cronologicamente distante da sociedade norte americana onde, porém, alguns hábitos ainda estão vivos, ou, na mais viável das hipóteses, são mesmo intrínsecos à nação americana.
As três partes de “Cavalo pálido, pálido cavaleiro” (Antígona, 2014) estão dissociadas entre si; contudo, têm um fio condutor em comum: o sofrimento das personagens, a saudade, a imposição de regras rígidas que surgem do exterior. Ao abrigo de descrições muito cuidadas, Katherine Anne Porter tem o dom de introduzir o leitor no ambiente que descreve nos seus contos.
No primeiro texto, duas irmãs sobrevivem com o pai às saudades de uma mãe que surge como ausência permanente nas várias fases de crescimento pelas quais estas passam. «(…)Penetrando no seu mundo familiar de soalhos nus e cintilantes e de comida saudável e insipida e de banhos de agua fria e orações regulares, o seu mundo de pobreza, castidade o obediencia(…)», assim é descrito o quotidiano das jovens irmãs, vistas com desdém por grande parte da família, sendo o funeral de um tio o epicentro dessa falta de amor.
De seguida surge um conto que relata a chegada de um sueco a uma quinta no interior dos Estados Unidos. Pacato e dedicado ao trabalho que o ocupa todo o dia, o escandinavo cedo recebe a admiração de todos, mas a sua altivez perante os outros e a sua desconexão para com os hábitos sociais são também vistos com desconfiança. Sob o olhar controlador dos pais – o casal Thompson -, os filhos dos fazendeiros provocam o empregado que é obrigado a surpreendê-los com modos rudes. A forma desajeitada como o trabalhador sueco se comporta traz à propriedade um estranho que pretende resgatá-lo, missão que levará ao desenrolar de uma inesperada tragédia.
Finalizando mais uma grande obra que a Antígona edita este ano voltamos a Miranda, agora jornalista e mulher, que cedeu o coração a um soldado americano. Enquanto este luta pela América na guerra, Miranda luta contra a morte, sendo que não é certo que os dois sobrevivam. A angústia e a incerteza de Miranda absorvem-nos. Neste conjunto de contos somos confrontados com uma reflexão de Katherine Anne Porter, que se debate sobre os receios humanos e as futilidades do que ambicionamos.
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