A Arte de Autor continua a contar-nos a história dos irmãos Centobucchi, um quinteto de emigrantes – e irmãos – italianos, que oferece uma visão trágica sobre a história da América moderna. “Spaghetti Bros: Livro Dois” (Arte de Autor, 2021), o segundo volume de quatro a serem publicados, reúne os tomos 5 a 8 da história escrita por Carlos Trillo e desenhada a preto e branco por Domingo Mandrafina, que começou a ser publicada no ano de 1992. Uma série noir e com violência a rodos, que se movimenta nas linhas de um triângulo onde são a Máfia, a Polícia e a Igreja a mandar nos seus vértices.
Amerigo Centobucchi é o Tony Soprano lá do sítio, o mais velho e temível deste perturbado grupo de irmãos, que sofre de um Complexo de Édipo capaz de lhe provocar alucinações. Um tipo a que falta o estilo, o requinte ou o código de honra que nos habituámos a ver em grandes produções cinematográficas. É desprezível, machista, asqueroso e violento, e controla um dos mais implacáveis grupos mafiosos de Nova Iorque dos anos 1930.
O disfuncional quinteto familiar vê-se completado por um estranho conjunto: um padre (Frank) que não tem medo de usar o crucifixo como arma de arremesso; um polícia (Tony) algo ingénuo e com uma visão abrangente da lei; uma actriz (Gipsy, ou Cathy) que usa o corpo sem medo para subir na escadaria da fama; e uma mãe de família com uma bem escondida vida dupla (Carmela), que combate o tédio de arma em punho. Família é, porém, família, pelo que todos parecem incapazes de seguir caminhos em separado, enredando-se numa teia que tem tudo para virar tragédia – isto depois de esgotados todos os encobrimentos e desvios à ética, à moral e à lei.
O Livro Dois continua dominado pela ambiguidade, deste grupo de irmãos para quem o amor e o ódio estão a uma curta distância. Frank, que parece seguir à letra a expressão bíblica de que Deus escreve direito por linhas tortas, continua a acreditar que “Amerigo no fundo não é mau”, tratando de escavar bem fundo e atirar a areia para cima de todas as provas e evidências; Gipsy aceita entrar no jogo das revistas cor-de-rosa, mantendo uma relação de fachada para satisfazer o público e cumprir a ideia de que a ficção se pode tornar realidade – o clássico conto de fadas; Carmela alarga ainda mais o âmbito da sua vida dupla, mantendo uma relação amantizada com Samuel Gerscovich, um gangster que dá boas dores de cabeça a Amerigo; Amerigo que continua a ser um mimo para o ideal Freudiano, vendo aqui a sua vida ficar em risco por várias vezes.
Um cenário de telenovela venezuelana a preto e branco onde há, também, a entrada de novos personagens da família, seja alguém que sofre de bullying na escola ou um outro que desempenha o papel de correio sentimental, colocando ainda mais camadas sobre esta divertida e violenta crónica de costumes.
Trillo e Mandrafina, ambos argentinos, iniciaram a sua colaboração nos anos 1980, então no universo do policial noir. A primeira joint venture recebeu o título de “Los misterios de Ulises Boedo” e, mais tarde, realizaram uma série de histórias mudas publicadas na revista Superhumor, para além da série El husmeante, desenvolvida para a publicação Don. “Piñón Fijo”, “Peter Kampf lo sabía”, “Cosecha verde” (publicado ente 1r989 e 1991 na revista Puertitas), “El Iguana” (que continua a história de Cosecha verde) e Spaghetti Brothers são outras aventuras desta dupla.
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