A Kalandraka continua a apresentar, aos leitores portugueses, a obra de Gianni Rodari, um dos grandes renovadores da Literatura Infantil e Juvenil. Alguém que, ao ofício de escritor, juntou também os de político – esteve vinculado ao Partido Comunista Italiano -, jornalista e pedagogo, com livros tremendamente humanistas que questionam e desafiam a autoridade, o controlo e a privação da liberdade.
Como escritor, levou para casa o Prémio Andersen em 1970 e, entre as suas obras, estão o fabuloso “Contos ao Telefone”, no qual mostrou que a brevidade poderia ser sinónimo de boas narrativas, ou “Era Duas Vezes o Barão Lamberto”, uma demanda pela eterna juventude e a preservação da memória. Mais recentemente, chegou às livrarias “Gelsomino no País dos Mentirosos” (Kalandraka, 2020), livro onde somos transportados até um reino em que todos vivem subjugados por leis injustas e onde a verdade se tornou uma palavra oca.
“Era uma vez um menino qualquer, talvez até mais pequeno do que os outros, mas que desde os primeiros berros revelara ser o proprietário de uma voz verdadeiramente estrondosa”. Este “menino qualquer” responde pelo nome de Gelsomino e, graças a este dom musical mal compreendido, teve de viver a escola de lenço enfiado na boca para não causar acidentes. Até mesmo em casa foi proibido de abrir a boca, de forma a proteger os já desfalcados serviços de louça.
Gelsomino acabou por crescer e tornar-se um jovem, mais baixo do que alto, mais magro que gordo, obrigado a deixar a sua cidade para procurar um outro destino no País dos Mentirosos, um lugar onde é obrigatório por lei não contar a verdade. Um reino governado por Tiagão, um ex-pirata careca que usa sempre uma peruca laranja flamejante.
É neste País, onde dizer a verdade dá direito a manicómio, que Gelsomino irá dar livre curso ao seu dom, numa luta pela liberdade e pela livre expressão onde contará com a ajuda do Tripé, um desenho de parede de um gato com uma pata a menos, de Barnabé-Sempre-em-Pé, que nasceu há apenas dez anos mas deve ter pelo menos uns 75 ou 76, e de Bananito, capaz de transformar os seus desenhos em personagens e objectos reais.
Uma edição em capa dura que conta com as ilustrações de Pablo Otero, parceiro de aventuras de Gianni Rodari em muitos dos seus livros. Como diz e bem a sabedoria popular, quem diz a verdade não merece castigo – ou ir parar ao manicómio, acrescente-se.
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