Depois de “Os Pilares da Terra”, foi possível voltar a Kingsbrigde em “Um Mundo Sem Fim”, naquilo que foi uma leitura aborrecida e desinteressante apenas salva por uma exemplar adaptação a mini-série televisiva. Mas Ken Follett é e sempre será um dos grandes mestres do romance histórico, e isso fica provado em “Kingsbridge: O Amanhecer de uma Nova Era” (Editorial Presença, 2020).
Passado entre o final do século X e o início do século XI, o final da Idade das Trevas e o início da Idade Média, este novo livro reúne todos os elementos indispensáveis ao autor: personagens isoladas que se cruzam, uma protagonista fortíssima, um cenário medieval, um quotidiano verosímil e factos históricos.
Se, por um lado, acompanhamos a perspectiva micro da população inglesa a partir de 997, conhecendo com pormenor o seu estilo de vida, preocupações, condição social, trabalho, relacionamentos familiares e necessidades básicas, por outro acompanhamos a visão macro daquilo que foi o Reino Unido na transição de séculos e na entrada na Idade Média: o poder da aristocracia e a sua relação com a nobreza e a realeza, a pobreza do povo, a triangulação entre o Estado, o Clero e a população e o crescimento sócio-geográfico.
À semelhança do que acontece nos seus outros livros da colecção Kingsbridge, também aqui encontramos elementos negros que conferem o realismo a que Kollett nos habituou. No século X, as mulheres são inferiores. Violação, tortura e outros maus tratos psicológicos, físicos e morais são constantes na relação entre o Homem e a Mulher, que, como sabemos, sai sempre prejudicada. A sua voz é muda. No século X, a fome é determinante. O autor reflecte o instinto de sobrevivência na procura constante de trabalho, assente na criatividade de cada personagem e nas suas necessidades primárias e ambições: proteger a família, contribuir para uma casa, criar uma carreira. No século X, a população está exposta aos elementos. A brutalidade dos Vikings, as guerras eminentes, as batalhas constantes. Tudo influencia tudo. No século X, a lei é escrita, mas muitas vezes contornável e ignorável.
Tecendo uma teia com três linhas diferentes – uma para cada personagem principal – e um fundo tridimensional, texturado e complexo, Ken Kollett cria mais uma vez uma obra de forma exímia, respondendo ainda aos leitores mais entusiastas sobre uma grande questão: e antes de Tom, o pedreiro?
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