Paulo Moura é jornalista freelance e escritor. Estudou História e comunicação social, viajou, tornou-se repórter de zonas de crise, foi correspondente em Nova Iorque e, segundo a sua página web no jornal Público, ganhou tarimba por entre “caminhos difíceis, lugares pouco recomendáveis e más companhias”.
Até agora, o premiado repórter já havia publicado uma dezena de obras de não-ficção de assuntos variados como política, viagens e guerras. Os temas predilectos do autor são recorrentes na sua obra e “Hipnose” (Suma de Letras, 2020), o seu primeiro romance, não é excepção. Além das personagens e enredo fictícios, o que distingue este livro da sua restante bibliografia é a liberdade e descomprometimento com que Paulo Moura, o romancista, reflecte sobre o mundo real.
“Hipnose” conta a história da grande decepção de Chespirito Diaz, um jornalista mexicano em busca de “uma forma de trair a sua origem social” e, por conseguinte, alcançar o sonho americano. Diz-se que temos apenas uma oportunidade para subir na vida. Para alguns, o elevador social surge de forma acidental, mas há quem trabalhe afincadamente para que esta oportunidade não seja desperdiçada. Mas como, exactamente, se escala a pirâmide hierárquica? Quem define os seus níveis? Como se penetra em círculos sociais para os quais sabemos que, à partida, não seremos convidados? As façanhas das personagens centrais do livro, cujo desígnio comum é a ambição de elevação social, oferecem-nos respostas para estas questões. Chespirito quer mudar o mundo, Gloria almeja a notoriedade e MC Disaster tenciona unificar gangues rivais: “Hipnose” relata os seus encontros, conflitos e desilusões numa deliciosa teia narrativa.
A maior parte da intriga desenvolve-se nos Estados Unidos da América, o palco ideal para um história de superação. A acção, que decorre entre 1993 e 2003, cobre uma série de eventos, entre os quais a eleição de Bill Clinton, os ataques ao World Trade Center e a queda do regime de Saddam Hussein. No cenário, surgem lóbis, sociedades secretas, conflitos armados e, no pano de fundo, um misterioso encenador que se dedica à actividade que dá nome ao livro. Longe de ser frenética, a cadência da prosa atinge o seu pico em pleno teatro de operações da guerra do Iraque, aquando do resgate do soldado Vonnegut 5 — uma alusão a “Matadouro Cinco”, o manifesto anti-bélico do escritor norte-americano Kurt Vonnegut.
Ambicioso como os protagonistas do seu primeiro romance, Paulo Moura coloca a fasquia da sua escrita criativa num patamar elevado. Para além de suscitar uma reflexão sobre determinismo e os sortilégios da sugestão, um dos maiores méritos de “Hipnose” é a evidência de que um simples gesto, quando devidamente orquestrado, tem potencial para alterar o curso do mundo. Tendo o autor assistido de perto aos acontecimentos mais importantes das últimas décadas, este seu testemunho, ainda que ficcionado, é indiscutivelmente relevante. Aguardam-se as cenas dos próximos episódios, uma vez que Paulo Moura terá certamente muitas mais histórias para contar.
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