“Provo-te” (Marcador, 2015), de Catarina Beato, é um livro de amores, com doze meses, doze cidades, doze receitas e doze ilustrações, o que faz desta colectânea uma obra heterogénea e abrangente nestas coisas do coração. A autora propõe oferecer-nos doze histórias de amor com um final feliz, mesmo quando este não é muito evidente, oscilando entre o que apelida de amores de filmes de domingo à tarde e histórias mais tristes, mas com um twist positivo ou pelo menos otimista. As ilustrações e receitas de Ana Gabriela Pereira são o complemente indispensável que torna o livro especial, uma peça esteticamente apelativa, a guardar como item de coleccionador. Mas vamos por partes – primeiro, as histórias de amor.
Se o leitor procura um livro sobre amores e desamores, com uma linguagem próxima e uma postura intimista, tem aqui a (sua) sorte grande. Catarina Beato constrói as suas narrativas quase como entradas de um diário que decide partilhar com quem quiser ler; apesar de serem contos muito diferentes entre si, a narração na primeira pessoa pressupõe uma intimidade, um tom de confissão que torna a experiência da leitura uma conversa particular, um pouco unilateral, é verdade, mas ainda assim uma conversa. Se a escrita convence por esta proximidade com o leitor, a tendência para a repetição ou reiteração, se preferirem, acaba por se tornar monótona e ser usada mais como bengala do que como recurso estilístico. Na verdade, a reiteração pode resultar muito bem, mas é um bicho difícil de treinar e nunca garante resultados positivos. Porém, não é nada que mereça a forca, de todo, até porque a escrita tem as suas qualidades redentoras.
Quanto aos contos em si, são suficientemente variados para se poder dizer que há algo para todos, para o menino e para a menina. De facto, são tão multifacetados como o amor em si, o que significa que o leitor pode torcer o nariz com um e sentir-se plenamente identificado com o seguinte. Oscilam entre os amores mais poéticos e os mais prosaicos, traçando um pequeno mapa para o multiverso que é o amor, abordando a sua complexidade, beleza e lições, combinando a descoberta, a frustração e a aprendizagem dos afectos e da vida.
E passemos agora às ilustrações e às receitas. Se as primeiras são belas, as segundas serão invulgares. As ilustrações são o introito perfeito para os contos, imagens pertinentes sem serem óbvias, e o traço de Ana Gabriela Pereira é de uma sensibilidade tocante, tão intimista como a narrativa. Fica a vontade de emoldurá-las e encher uma parede com elas, deixar o olhar preguiçar sobre cada linha e criar a nossa própria história a partir de cada imagem. E fica, também, o desejo de outra colaboração para termos, na estante ou na mesa-de-cabeceira, outro objecto tão bonito como este. Em relação às receitas, são invulgares na medida em que o amor aqui leva muita aveia. Muita. São receitas saudáveis, com os ingredientes da moda e que, à partida, não lembram o amor. Foge-se ao cliché do chocolate, das frutas mais ou menos exóticas, da carne, da doçaria e apresenta-se um rol de receitas que podiam ter sido passadas por um nutricionista. E porque não? Porque não há-de o amor ser algo saudável e substancial sem ser decadente? Talvez o leitor agradecesse um pouco menos de aveia e um pouco mais de tâmaras ou delícias turcas dadas à boca, mas é de louvar a abordagem menos convencional.
Se o leitor quiser regalar os olhos e o coração, tem aqui um livro ideal para esse efeito; e para regalar o estômago, claro, se for fã de aveia.
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