Há livros inesquecíveis: pela abordagem de temas essenciais à vida dos humanos; pelo extraordinário manifesto politico que encerram; pela originalidade da trama; pela extrema sensibilidade transposta para a escrita; pela magnífica forma como escrevem; pela esteira que abrem para o futuro emocional e ético na mente dos leitores. É o caso (e em todas as vertentes enunciadas) de “Conduz O Teu Arado Sobre Os Ossos Dos Mortos”, livro escrito por Olga Tokarczuk (Cavalo de Ferro, 2019), autora distinguida pela academia sueca com o Prémio Nobel da Literatura em 2019. A escritora, polaca, nascida em 1962, publicou já seis romances e dois livros de contos, sendo considerada uma das melhores escritoras europeias da actualidade.
Através das perceções e sentimentos, transmitidos pela extraordinária e carismática personagem de Janina Duszejko – uma engenheira de pontes e professora de inglês reformada, que vive num lugarejo de sete casas e que tem, por ocupação, cuidar no inverno rigoroso de quatro casas apenas habitadas no verão -, Olga Tokarczuk obriga o leitor a uma apurada reflexão sobre grandes temas da humanidade.
Neste lugar onde habitam inúmeros animais (para além das suas Meninas, duas cadelas que eram a família da personagem, mortas pelos caçadores), Janina Dusjejko desenvolve os seus conceitos sobre a sua visão da Vida e do Mundo, infundindo no leitor um respeito absoluto pela senciência dos animais.
Uma fábula policial que tem muito de emocional pela forma de ver o Mundo, pondo nos pensamentos verbalizados da personagem principal importantes conceitos de política humana sobre a ética para com os animais – num amor profundo por todos os Seres e pela posição que todos têm de ocupar no Planeta. É impossível o leitor ficar indiferente face a pensamentos que falam sobre a forma como nos ensinaram a sentar descontraidamente a uma mesa de almoço ou jantar, onde nos são servidos partes de cadáveres que foram objecto de um sofrimento inimaginável antes da sua morte.
Olga traz-nos uma personagem que comunga totalmente com a Natureza. No fundamental, ela sabe que os animais (corças, raposas, javalis, etc.) perseguidos por caçadores implacáveis são capazes de sentir dor e de desejar que ela acabe. Nesta aldeia existem muitos caçadores, um deles furtivo e especialmente cruel – o Pé Grande -, que aparece morto (assassinado?) logo no início do livro.
O livro foca-se nesta personagem Janina, que abarca (através da sua Ira e das suas lágrimas) todo um conjunto de conceitos e valores sobre o posicionamento do ser humano no Planeta – e que o reconduz à própria Natureza (de onde provém) e ao Todo universal, que constitui o conceito de Vida Livre para todos seres no Planeta Terra. Um livro imprescindível na biblioteca das nossas emoções e conduta de vida, tal como o inesquecível livro de J.M.Coetzee, “A vida dos animais”.
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