É um daqueles livros que fazem pendant com estes dias quentes, e que poderíamos facilmente encaixar na categoria das leituras de praia. Thriller muito bem desenhado, “A Corrente” (Editorial Presença, 2020) adapta o esquema da pirâmide a um ciclo imparável de raptos que se vai estendendo no tempo, tudo graças à imposição do medo e a um sistema de vigilância que deixaria o Grande Irmão de Orwell orgulhoso.
A coisa funciona mais ou menos assim. Do nada, uma pessoa recebe um telefonema de um número desconhecido, que começa invariavelmente da mesma forma, antes do anúncio de um rapto de um ente querido: “– Duas coisas que não pode esquecer – diz uma voz, distorcida por um dispositivo qualquer. – Uma: não é a primeira e certamente não será a última. Duas: lembre-se, não se trata de dinheiro, trata-se d`A Corrente”.
A isto segue-se uma série de instruções, que passam pelo depósito de uma quantia considerável – e variável – através de uma rede pirata, a obrigatoriedade de usar telefones descartáveis, a proibição de contactar a polícia e, claro, ter de avançar com o rapto de alguém, desde que o alvo seja aprovado por quem inventou este jogo macabro. A partir do momento em que o próximo alvo paga a quantia, o ente querido é devolvido e o ciclo recomeça. Uma espécie de rapta ao outro e não ao mesmo.
No centro do furacão está Rachel Klein, que vê a sua filha raptada por um casal que lhe diz ter também o seu filho raptado, e que se seguir as instruções tudo ficará bem. O importante mesmo é perpetuar a corrente no tempo, seguindo as instruções e tratando de recuperar do choque quando forem outros a herdar o problema.
Com a ajuda do ex-cunhado, um ex-militar com um gosto particular por estupefacientes, Rachel tentará recuperar não só a filha mas, também, destruir os elos que unem esta corrente. Um livro que se lê a cem à hora e que, para além de sugerir que muitas vezes somos a nossa própria polícia secreta, revela uma outra verdade, válida para situações de fio na navalha: “A civilização é apenas um verniz fino e frágil sobre a lei da selva”.
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