É preciso algum cuidado para manusear “Os Conspiradores” (Lua de Papel, 2019), terceiro romance do sul-coreano Un Su-Kim – é um thriller cheio de lâminas e arestas aguçadas. A história desenrola-se na Coreia do Sul, numa versão distópica da cidade de Seul, onde muitos governantes, empresas e cidadãos anónimos recorrem a assassinos a soldo quando querem pôr um ponto final nos seus problemas.
O protagonista do livro é Reseng, um experiente e gélido assassino profissional. No primeiro capítulo encontramo-lo no flanco de uma montanha, escondido pelas árvores, a mira telescópica da espingarda centrada no coração de um velho general, que rega tranquilamente as flores no pátio de sua casa. Surge o momento perfeito para o disparo. Sem saber exactamente porquê, Reseng não aperta o gatilho, e esse facto vai dar início a um carrossel de consequências nefastas.
Reseng é um mistério. Encontrado num caixote de lixo em bebé, foi criado numa Biblioteca muito particular, que serve de fachada a uma agência de homicídios. Quem o criou desde bebé foi o homem a quem chamam Velho Guaxinim, mais um do naipe de personagens carismáticos que vão surgindo ao longo do livro. Muitos são figuras implacáveis, uma horda de facínoras capazes de trazer um azar fatal a quem com eles se cruza.
O meditabundo Reseng recebe as ordens de assassinato dos obscuros Conspiradores, que se encontram no topo da cadeia alimentar neste negócio. Qualquer improviso ou desvio às ordens detalhadas pode resultar em mais um nome a acrescentar à lista de vítimas – o do próprio assassino.
Há por aqui ecos do estilo surrealista do japonês Haruki Murakami, e uma violência gráfica que lembra algum cinema sul-coreano – “Old Boy”, de Park Chan-Wook, por exemplo. O enredo é um pouco titubeante, parecendo à deriva em alguns pontos, onde o autor carrega nas cores da crise filosófica que atormenta o protagonista, aqui e ali soando algo forçada.
O melhor do livro está no engenhoso e surreal primeiro capítulo, que poderia viver por si só como um fabuloso conto. Destaque também para as descrições vívidas das muitas cenas de acção, elegantes e selvagens bailados de facas afiadas, e ainda para o expressivo arranjo gráfico da capa.
Sem Comentários