“Aves migratórias” (On y va, 2019) é um livro de 63 páginas, constituído por 6 andamentos – Aves migratórias (que dá o nome à obra), Animais marinhos, Orfandade, Sem rosto nem fim, Silêncio e Transpiração. A autora, que nos apresenta um universo parcelado em vários mundos (“cada poema é um mundo, por si”), diz-nos que os poemas “são como aves, mas também podem ser árvores; um poema é algo que nos faz voar ao mesmo tempo que nos liga à terra, às raízes”.
Gabriela Ruivo Trindade (Lisboa, 1970), que vive em Londres desde 2004, é formada em Psicologia. Após o seu primeiro romance, “Uma Outra Voz”, que venceu o prémio LeYa em 2013, publicou o conto infantil “A Vaca Leitora” (D. Quixote, 2016) e participou em várias antologias de poesia e conto. Ademais, dirige a Miúda Children’s Books in Portuguese (uma livraria online com sede no Reino Unido especializada em literatura infanto-juvenil escrita em português) e mantém o blog https://gabrielaruivo.blogspot.com. “Aves Migratórias” é a sua estreia no campo da poesia.
Num afastar da poesia tradicional, temos poemas com grande movimento (“os meus passos desenham o inverno” em “Aves migratórias”), jogos de palavras que “(de)cantam” e inúmeras metáforas, eco de Camões (por exemplo, “O amor é uma criança exigente” em “Um parágrafo”). A necessidade que a autora parece ter de se exprimir, reflecte-se, entre outros, na forma como, por vezes, se direcciona a alguém (“(…) lembra-te de secar as fontes / da minha voz (…)” em “Grito”). Apresenta um especial carinho pela palavra “costas” “(…) nas minhas costas / nuas” em “Margem de erro”, “(…) a textura das costas em fogo manso pelos ombros.” em “Orfandade” e “(…) As costas deixavam de lhe pertencer (…)” em “Temperatura”.
Apesar da dor e sofrimento transmitidos com um sentimento resoluto (“Ninguém me avisou que o coração parava / E a gente morria” em “Aviso”), o tom geral é optimista. Muitas referências à morte (por exemplo, “(…) a morte cinzenta e estagnada da razão” em “Vazio”), que são compensadas por um sentimento preponderante – amor. Como refere a poetisa na sua “Advertência”, “O amor é o mais perto que podemos estar do infinito”, e é o amor que está por toda a parte na sua obra, com estrofes de pujança enriquecida como “lamento, sim, / a inocência dos dias / em que não sabia / que era na tua pele / que respirava” em “Lamento” ou de dedicação apaixonada como “(…) o amor só exigia a lua / a via láctea / o universo inteiro / na palma da tua mão” em “O amor”.
De salientar, a capa exibe um maravilhoso desenho de Sónia Queimado-Lima, que muito se complementa com a cor verde seca que o acompanha.
Aconselha-se a leitura de “Aves migratórias” a quem deseja a “musicalidade da linguagem” propagada por esta escritora multifacetada.
Sem Comentários