Ao se ler “O Diário de Anne Frank”, o sentimento é de total arrebatamento. Por tudo aquilo que lhe diz respeito (a história, as circunstâncias, o tom da narrativa, as observações do particular, o desentendimento do presente, o destino), o livro tira o fôlego ao leitor.
Agora, mais de trinta anos de ser publicado o original, chega a Portugal “A Mulher que Escondeu Anne Frank” (Alma dos Livros, 2019), de Miep Gies, a mulher que foi uma das principais responsáveis pelo desaparecimento da família Frank na Holanda (que, segundo constava, estava na Suíça) e os companheiros que viveram no anexo em Amsterdão ao longo de praticamente dois anos.
O que tem este livro de tão especial é precisamente ter-se encontrado uma voz para quem estava de fora: fora do anexo, fora do alvo assinalado pelos nazis. Mipe Gies, amiga próxima da família que se aproximou, anos antes, de Otto Frank, partilha a sua experiência durante a segunda guerra mundial, em particular no que respeita à ocupação da Holanda e à sua dedicação e lealdade perante os vários ocupantes do anexo (e outros tantos que conheceu ao longo desses anos negros).
Se, por um lado, Anne Frank era uma criança e o seu diário reflecte a sua visão sobre o mundo e os horrores da guerra, Miep Gies dá corpo a esta mesma perspectiva e revela os pormenores que dizem respeito a este encobrimento. Considere-se, a título exemplificativo, a necessidade de encontrar alimentos para nove pessoas que, para todos os efeitos, não existiam, no meio de uma guerra e de uma política intransigente de racionamento; ou mesmo o risco que Miep correu ao longo dos anos, unindo todos os esforços para continuar a praticar o Bem e lutando com todas as suas forças para continuar a acreditar num futuro com Paz.
O testemunho de Miep Gies vem reforçar (ainda mais) a realidade vivida e narrada por Anne Frank, dado ambas terem tido uma relação especial. Miep conheceu-a. Foi Miep quem encontrou o seu diário e o guardou para o devolver, sempre na esperança de que tudo acabaria bem para estas pessoas. Miep estava no escritório quando as forças entraram, no seguimento de uma queixa apresentada sobre pessoas escondidas no anexo. O marido de Miep viu-os a entrar no camião que os levaria para a morte. Miep vivia tranquilamente em Amesterdão e viu a guerra chegar, lutou como pôde e viu a guerra partir. Miep partilhou a sua história, que é a história de tantos, e homenageou Anne Frank de uma forma única. Apenas ela o podia ter feito desta forma.
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