Não será um caso Disney à moda de Tio Patinhas e companhia, onde nem um ano parece ter passado pelo corpinho de tanto pato, rato, cão e outra animália, mas a verdade é que, vinte e nove anos depois, Darryl e Wanda Scott continuam bem conservados e constantemente em trabalhos, tomando conta de uma prole que inclui já três descendentes.
Criada em 1990 por Rick Kirkman e Jerry Scott, Baby Blues é um caso de longevidade no que diz respeito à banda desenhada servida às tiras. “Criança Não Entra!” (Bizâncio, 2019), o nº 36 da colecção, continua a navegar em terreno familiar, mas nem por isso deixa de cumprir a função de levar o leitor a soltar umas boas gargalhadas com esta empresa familiar que parece estar sempre perto de ruir – ou, pelo menos, de levar um dos pais a um esgotamento sem retorno.
Ao longo de mais de 150 páginas, o leitor vê-se projectado para o interior de uma vida familiar, ao pé da qual a entrada num buraco negro é como descer um escorrega para crianças. Hammie, por exemplo, apresenta-nos a sua lista de coisas por fazer da semana, que inclui coisas essenciais como tirar macacos do nariz – nada a estranhar em quem se habituou a lamber o fio dental de uma ponta à outra. Mas o rapaz também consegue surpreender, tornando-se, para orgulho da mãe e desespero da irmã mais velha, num ás da costura; Zoe decide lançar-se na literatura, com um drama familiar ao estilo de Karl Ove Knausgård que começa assim: “O Hammie, quando nasceu, era feio que nem um babuíno”; já a pequena Wren, que todos evitam no parque infantil devido à sua ligação com Hammie, começa a ganhar uma certa autonomia – já consegue formular um Na-Na quando o irmão lhe tenta pôr as culpas de um valente entornanço de tinta.
Darryl e Wanda vão experimentando a espaços comida saudável, onde os croutons são cubinhos de chocolate, formulando aquele pensamento que, por vezes, bate como um martelo pneumático na cabeça de pais com uma prole considerável: “Sinto que eu e os meus filhos nos andamos a encontrar demais” – palavra de Wanda, que começa a ter dúvidas com ter posto de lado a sua carreira para cuidar desta canalha. Darryl acha os fins-de-semana tão agrestes que, a manhã de segunda-feira no trabalho, lhe sabe a mel.
Há também conversas sobre a magreza das reformas, nova vizinhança a aparecer, o cinema transferido para a sala-de-estar, a luta eterna entre cozinhar ou mandar vir comida de fora e as primeiras aulas de natação. Como o escreveu Coupland num romance, todas as famílias são psicóticas. Confere.
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