Foi aos 15 anos que Cristopher Paolini escreveu a sua primeira versão de Eragon, personagem que viria a estar no centro de uma série de fantasia, lançada em quatro volumes, que teve como clara inspiração o universo de Tolkien. Algo que resultou em qualquer coisa como Tolkien para totós, em livros que, na adaptação ao grande ecrã, se ficaram pelo claramente desinspirado filme de Stefen Fangmeier de 2006.
Uma saga literária que, com os seus altos e baixos, levou muito bom adolescente – e adulto – a entrar nos domínios da fantasia, acompanhando a história de Eragon, um rapaz camponês sem grande futuro pela frente que, ao descobrir acidentalmente um ovo de dragão, vê a sua vida transformar-se, acabando por ser treinado por um mentor com o objetivo de derrotar um malvado imperador – posto desta form,a parece de facto um cruzamento entre O Senhor dos Anéis e o Star Wars.
Escrito 15 anos depois de “Herança”, “O Garfo, a Bruxa e o Dragão” (Asa, 2018) decorre apenas um ano desde que Eragon partiu em busca de um lugar perfeito para treinar uma nova geração de Cavaleiros do Dragão, dedicado a tarefas pouco entusiasmantes para quem está habituado à boa vida das aventuras: construir a Fortaleza do Dragão, entender-se com todo o tipo de fornecedores, cuidar de ovos de dragão e lidar com as desavenças e amuos de Urgals e Elfos. Porém, quando a burocracia parece ter levado a melhor, eis que uma visão dos Eldunarí e uma lenda Urgal lhe trazem novas distracções e um ainda maior desafio.
“O Garfo, a Bruxa e o Dragão” está dividido em três partes e é, diga-se, um muito bem conseguido regresso a Alagaesia, que os agora adultos irão ler como se recordassem os tempos de liceu num jantar bem regado.
Em “ Garfo” acompanhamos a difícil e muito burocrática missão de Eragon no governo de uma grande cidade, valendo-lhe o hidromel que parece nunca faltar. A pequena Essie, filha de Jarek – chefe dos pedreiros e dono de uma hospedaria -, desabafa com um estranho sobre os seus problemas com outra miúda, que é constantemente má para si e que faz com que as amigas a provoquem. O estranho, que se diz chamar Tornac, fala-lhe de pedras pretas queimadas pelo fogo, mas sem sinais de chama ou fumo, dando-lhe alguns conselhos sobre como lidar com este bullying das classes altas numa história que, para além de antever o jogo do espeta, termina com uma revelação surpreendente e o regresso de um personagem maior da série.
Com “A Bruxa” regressamos ao território de Angela, a Herbalista, sempre acompanhada de Solembum, o Homem-Gato. Com eles está Elva, a menina com a marca do dragão, que carrega em si a maldição de auto-sacrifício que Eragon lançou sem querer sobre ela. Uma história de emancipação que inclui a autobiografia desordenada e ainda incompleta de Angela, escrita por Angela Paolini, irmã do autor e a mulher que serviu de inspiração a esta personagem: “Muitos são os que me têm considerado uma pessoa frívola, e é assim que eu gosto”.
A fechar temos “O Garfo”, uma lenda dos Urgals com contornos de épico, onde a partir da história de Vêrmund, o Soturno, um dragão velho e cruel que aterrorizava sem dó nem piedade uma aldeia, se fala da sabedoria da aceitação – “com o tempo, todos se tornam presas” – e do constante desejo de aprendizagem: “Aprender era um dos maiores prazeres de Eragon e ele ainda tinha muito para aprender sobre história, Alagaesia, os dragões e a vida em geral”. E também o leitor terá muito a aprender com este bem-sucedido regresso a Alagaesia, num livro que prepara, certamente, o regresso de Paolini aos livros de muitas páginas e volumes.
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