Francisco Moreira cresceu em Portugal, mudou-se para o Reino Unido aos 20 anos e, nos dias de hoje, reparte o seu tempo entre os dois países, dedicando-se à criação de marcas no mundo das startups. Um universo que, ainda que de forma dissimulada, acaba por estar presente em “Os Rumplings e a Aventura dos Sabores” (Oficina do Livro, 2018), o primeiro de uma série de livros para os mais novos, que tem no centro criaturas encorpadas com a pele macia, a face peluda e um considerável e permanente apetite.
A história passa-se na Vila de Kaér, onde há uma verdadeira guerra no que diz respeito ao que deve ser a vida, o quotidiano e o trabalho de cada Rumpling. De um lado estão o Rocket e o Xamã Buffalo, que seguem o credo da Casa dos Alimentos, que se guia religiosamente pelos valores da humildade, habilidade e perseverança – e que apontam a árdua mineração como o único e seguro modo de vida.
Do outro está Stratus, conhecido como o recrutador – e grande suspeito de ter morto os pais de Rocket -, que promete a todos casas à borla e comida ilimitada, convencendo lentamente os Rumplings a deixar para trás a vida de mineiros para se juntarem a ele e à Igreja dos Alimentos no Stratus Superior.
Entre premonições e diferentes olhares sobre o que deve ser a vida, Francisco Moreira parece tecer uma crítica ao pensamento neoliberal, apontado ao lucro e ao seu acumular, apostando antes na cautela e no acto criativo como o mais valioso reduto humano. Mas tudo isto nas entrelinhas, uma vez que todos os olhos da pequenada estarão apontados a estas estranhas criaturas e ao seu ainda mais estranho mundo, onde as religiões são uma espécie de partidos políticos alimentares. E o que dizer da revelação final, a fazer lembrar o espanto sentido em Lego o Filme? Apenas isto: que os vossos banquetes sejam abundantes e generosos!
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