Está, para a literatura infanto-juventil portuguesa, assim como o “Citizen Kane” está para os filmes a preto e branco. “Rosa, Minha Irmã Rosa” (Caminho, 2018 – 32ª edição), o clássico assinado por Alice Vieira, tem saltado e passado de mão entre gerações – a primeira edição chegou às livrarias no longínquo ano de 1979.
Uma história entre duas irmãs que, como muitas outras histórias de irmãs, não começa mesmo nada bem: “Quando a minha irmã nasceu, o meu desapontamento foi tão evidente que a minha mãe, abafada entre lençóis e cobertores da cama do hospital, me disse: – Ela vai crescer num instante!”.
Um instante é, porém, uma medida de tempo bem diferente daquela usada pelos adultos, e Mariana vai partilhando as suas agruras com a sua bff Rita, desviando-se do medo – e não respeito – que sente pelo pai mas, ao fim de quatro dias, a sua opinião não mudou lá muito em relação à sua irmã Rosa: “É muito feia, tem a cara toda às rugas e eu ainda não estou muito certa se gosto dela ou não”. Da família faz também parte a intratável tia Magda que, segundo Mariana, “só tem boca para palavras azedas, e só gosta de flores caras com nomes complicados, como os antúrios e as estrelícias” – e que acha que sabe tudo e tem sempre razão (arriscaríamos uma parentalidade com um antigo presidente português).
É, na sua aparente simplicidade, um livro que toca temas complexos e marcantes para uma criança, como a educação parental e a forma como esta pode ser decisiva – de forma positiva ou negativa -, a não obrigatoriedade de se gostar da família que se tem ou os avôs e avós que se conhecem, que nunca se conheceram e aqueles que se vão perdendo pelo caminho.
Por entre revisitação a tempos mais antigos – aqueles em que os professores davam reguadas e até se tinha medo de assobiar -, uma referência a Abril, cromos colados com cola a sério e uma apologia à matemática, assistimos ao crescimento de Mariana, aluna da 2ª classe e atenta observadora do mundo, que desde cedo encontra um mantra para tornar a vida num passeio: “Tudo é importante para o equilíbrio da nossa vida”.
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