“Nada aborrecido”, “Surpreendente”, “De cortar a respiração”.
Quando há um corrupio tão grande em torno de um livro, é impossível não ficar minimamente curioso sobre aquele que é caracterizado como um dos “thrillers do ano” e que promete reviravoltas atrás de reviravoltas – e um final mais que imprevisto.
Contextualizando: quando se vê obrigada a levar a casa um rapaz que fica sozinho nas aulas de natação, Cecilia, na sua boa vontade, dá boleia ao rapaz que, afinal, não vive em lado nenhum e aparentemente está abandonado. Num momento de hesitação, a mãe de família acaba por levá-lo para sua casa para que passe lá a noite. E depois?
Comecemos por partes: “O Rapaz à Porta” (Planeta, 2018) deixa-nos curiosos desde a primeira página. Quando tudo parece perfeito na vida de uma mãe dos subúrbios, eis que se vê envolvida num problema que não é seu e que, por falta de alternativas, tenta resolver rapidamente. Está lançado o mote para aquela que podia ser uma conversa de esplanada sobre as pequenas questões: “Sabes o que aconteceu à Cecilia? Nem imaginas como se desenrolou a história”.
Antevemos, pois, que este será um livro de puro entretenimento e que o mistério, que se vai adensando de capítulo a capítulo, consiga ser resolvido de forma verosímil e deixe o leitor sem respostas ou observações técnicas – dado o carácter formal que a história vai ganhando. Contudo, não são muitos os escritores que consigam manter o ritmo prometido no início da história, ou que consigam corresponder às expectativas dos leitores que, diga-se, já têm algumas páginas viradas em thrillers e policiais.
Cecilia é uma mulher superficial, e não apenas por se tratar de uma personagem bem construída, porque não é. Não é franca consigo mesma, não é franca com os outros. Conta a história na primeira pessoa e sempre no presente, tal como outras personagens que vamos acompanhando à medida que avançamos na história. À medida que conta a sua história, deixa pormenores escondidos para mais tarde os revelar e, surpreendentemente, damos por nós como espectadores de uma telenovela em prime time. Não há nada que não lhe aconteça nem decisões sensatas que consiga tomar o que, sejamos francos, é verdadeiramente inconsistente com a aparente maturidade desta mulher que tem tudo e que é perfeitamente capaz de conjugar os desafios lançados pela gestão da vida doméstica, amorosa, profissional e social.
SPOILERS
À medida que a história que avança, vamos encontrando inconsistências que causam irritação: então uma criança de oito anos tem força para atirar uma pedra suficientemente grande para acertar na cabeça de um adulto e o matar mas, mais tarde, já a considera tão pesada que só a consegue empurrar com o pé? Então e a justiça nórdica opta por achar que o rapaz é um coitadinho e que, por isso, nem sequer se considera um julgamento de menores para o homicídio de que é responsável?
Quando se lê procura-se, entre outras coisas, usufruir da experiência. Neste caso, fica-se com a nítida sensação de que era um livro escusado e com muitas passagens forçadas. Aquilo que podia ter sido contado em duas páginas durou centenas e, ao fechar o livro, nada fica. Apenas a sensação de perda de tempo.
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