“Uma localidade de becos sem saída e vielas estreitas, com muros altos que estavam encimados por vidros partidos, pedras afiadas e lâminas.”
Muito bem-vindos a “Darkmouth” (Editorial Presença, 2018), uma cidade que não aparece em muitos mapas, recebe poucas visitas e tem uma população que tende a ir diminuindo a olhos vistos, muito por culpa dos monstros conhecidos por Lendas.
Finn tem apenas 12 anos, mas é já apontado como o próximo caçador de Lendas, apesar do ser claro pouco jeito para a coisa e do desejo secreto de ser um veterinário. Isto numa família onde a tradição e o passar de testemunho são mantidos há já 42 gerações.
Em todas as outras aldeias se deixou de ensinar a profissão. Aliás, parece que apenas em Darmouth continuam a aparecer Lendas, o que faz com que o boato de que é o pai de Finn que lhes abre a porta pegue de caras. Habitantes que, dizem, poderão safar-se dali para a frente com kits comprados na Internet, mandando com os profissionais às urtigas.
O pai de Finn foi convidado a integrar o prestigiado Conselho dos 12, o que faz com que a passagem da aselhice para a mestria tenha de acontecer dentro de muito pouco tempo, já que a Cerimónia de Conclusão está por meses – o que põe as editoras em puro delírio, uma vez que poderão lançar uma nova e actualizada edição de títulos como “As Mais Grandiosas Vidas”.
E, se na família de Finn existem, à semelhança do universo da realeza, cognomes como Sean, o Bravo, Hugh, o Casmurro, Ragnall Calças de Ferro ou Conor Crânio Vermelho, há também a vergonha causada pelo seu avô, Niall Língua Negra, “o primeiro a tentar conversar com as lendas, a tentar chamá-las à razão e a tentar perceber porque é que elas queriam vir para este mundo”.
O mundo de Finn ganha alguma cor com a chegada de Emmie, a nova miúda com a sua cabeleira vermelho-fogo e uns hipnotizantes olhos verdes, mas tudo parece ser demasiado bom para acreditar.
Num mundo não assim tão distante – graças aos portais que se vão abrindo -, há um monstro que sonha com dominar o nosso mundo, enviando Hogboom, um duende com orelhas compridas, dentes tortos, pele verde e uma forte propensão para fazer travessuras, para apalpar caminho e deixar uma mensagem: “As lendas estão a erguer-se. O rapaz irá cair”.
Shane Hegarty, nascido e crescido na Irlanda e jornalista do Irish Times, estreia-se aqui com um livro bem castiço, onde junta humor, acção e uma história que sobressai na já congestionada auto-estrada do universo fantástico. Venha de lá essa continuação.
Sem Comentários