Editado em 1942, a Antígona devolve à actualidade o primeiro romance de Jean Meckert, figura de relevo das letras gaulesas no seculo XX mas que, por questões de debilidade financeira, nem sempre se pôde dedicar à escrita.
Em “Golpes” (Antígona, 2015), para acompanhar a descrição do desajeitado Félix e da frágil Paulette num romance instável, é necessária atenção redobrada de modo a não perder o fio condutor, tal é o temperamento imprevisível e esguio dos personagens principais. O enredo aborda a problemática da violência conjugal, não poupando o leitor a relatos incisivos de confrontos entre os dois.
De forma meticulosa e com descrições muito elaboradas de ambientes e locais, Meckert apresenta-nos as vivências de um casal onde impera a intolerância e a incompreensão mútua. O leitor não deixará de verificar a densidade do que é relatado por Jean Meckert, pois a postura impulsiva de Félix, um operário mal amado pela sociedade parisiense, culminará sempre no seu desdém por terceiros e na forma abusiva como trata a sua companheira de vida.
Ao conhecer Paulette na oficina do Sr. Parmain, cedo Félix se interessa por esta, abordando-a com os melhores modos possíveis. Mesmo tendo noção de que a sua adorável colega era comprometida com um artista outsider, o operário opta por não inverter a sua determinação e acaba por ser tornar cada vez mais próximo desta, proximidade essa que culmina no afastamento matrimonial de Paulette, que passa a viver com Félix.
Porém, a convivência com a família da sua nova dama irá provocar danos no relacionamento a dois, trazendo à superfície o lado mais brusco e viril de Felix. Este não suporta a frivolidade da extensa família de Paulette, refugiando-se no álcool e voltando, várias vezes, atrás no tempo, recordando os dias solarengos e felizes em que se conheceram na azáfama e confusão industrial do pequeno lar metalúrgico de Parmain. A angústia com o facto de expectativas recentes não terem sido cumpridas, é acentuada com o distanciamento de Félix perante o que os rodeiam e com os ciúmes do seu antecessor na vida de Paulete.
“Golpes” é, sobretudo, um olhar crítico de um individuo que se colocou à margem da sociedade, refugiando-se na força física, no ódio e na indiferença para lidar com terceiros. Um enredo que nos perturbará a todos.
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