“Cada homem tem os seus espinhos, não lhe pertencem, mas estão cravados nele, tão profundamente como ossos. As cicatrizes do espinheiro marcam-me com uma caligrafia de violência, uma mensagem escrita a sangue, exigindo uma vida inteira para traduzir.”
Três volumes depois, chega ao fim a Trilogia dos Espinhos. Como os títulos das obras denunciam, Jorge de Ancrath passou de príncipe a rei, mas conseguirá, no culminar da trilogia, tornar-se no “Imperador dos Espinhos” (Topseller, 2017)?
O britânico Mark Lawrence, criador deste mundo fantástico, queria que os leitores se despedissem de Jorg “num ponto alto”. Como refere numa última nota publicada no livro, prefere “que os leitores terminem o terceiro livro querendo mais em vez de fecharem o sexto livro sentindo que tiveram mais do que desejavam”. Diz o autor que “a história o exigia” – e bem!
Neste terceiro livro vemos várias pontas soltas serem amarradas, num desfecho sempre difícil para quem se apega às personagens, mas que lhes garante um fim digno e não tão óbvio quanto se possa pensar, com surpresas reservadas até ao final.
Antes de mais, Jorg evoluiu. Não é mais a criança de 9 anos que assistiu à morte da mãe e do irmão mais novo, a que jurou vingança. Agora, aos 20 anos, o seu lado negro, a faceta de herói-vilão, a vertente amoral e sangrenta que o caracterizam, bem como a ambição e a sede de poder, mantêm-se, mas está mais maduro, num caminho que sugere redenção.
Este terceiro volume começa cinco anos depois do anterior, mantendo a lógica de narrativa paralela, com duas histórias a desenvolverem-se em simultâneo, na actualidade e “cinco anos antes”. A estas junta-se a ‘História de Chella’, interessante, mas que fractura ainda mais a leitura, tornando-a por vezes confusa e difícil de acompanhar. Paralelamente com acontecimentos do passadoc que revelam alguns dos elementos mágicos deste mundo pós-apocalíptico, acompanhamos a viagem de Jorg até Vyene, onde decorrerá o Congresso para eleger um novo imperador. Há cem anos que nenhum candidato consegue assegurar a maioria necessária para dominar os cem reinos fragmentados, o Império Arruinado. Para lá chegar, Jorg terá de enfrentar o Rei Morto, o grande mistério da trama, que garante um final avassalador.
“Tinha vivido uma vida impelida pelo desejo, pelo desejo de vingança, de glória, de ter o que me era negado. Uma simples diretiva, pura e afiada como uma lâmina. E tal desejo, tal querer concentrado, era o alicerce de toda a magia.”
Sangue, intrigas, alianças, drama, emoção e algumas cenas épicas dão vida à história, que agora vê espectros juntarem-se aos fantasmas dos Construtores – possivelmente os mais fascinantes deste mundo -, que convivem com necromantes e outros seres malignos saídos de pântanos sombrios.
No final, fica a vontade de que o autor tivesse explorado mais certas personagens e os mistérios do mundo criado, mas a certeza de que a chave do sucesso desta trilogia se deve sobretudo à escrita de Mark Lawrence, centrada no narrador Jorg, capaz de desencadear ódios e paixões.
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