“A mulher-sem-cabeça e o homem-do-mau-olhado” (Bertrand Editora, 2017) é o mais recente livro de Gonçalo M. Tavares que, diga-se, é difícil de categorizar. Passado num tempo que não é quantificável, as várias histórias neste livro de mitologias decorrem todas em simultâneo, num universo onde não há passado, presente ou futuro. Apenas uma miscelânea de acontecimentos tão surreais quanto reais.
Pode dizer-se que Gonçalo M. Tavares faz uma justaposição perfeita entre o que é a realidade e o que não é. As treze narrativas que compõem o seu novo livro são de uma ingenuidade perfeita, com passagens tão belas quanto terríveis, o que resulta numa realidade quase infantil. Crianças que procuram a mãe, uma mãe que está presa na teia de aranha, um homem malfadado que deprime com o seu fado, a
invenção do cinema por incapacidade de grandes feitos, as histórias alemã e russa, a revolução industrial. Vários eventos da História estão presentes nestas histórias, como se tivessem sido coladas com papel vegetal sobre os mitos criados pelo autor.
Dizem os conhecedores que os mitos são os contos de fadas que não têm resolução e que, por norma, acabam mal. Em “A mulher-sem-cabeça e o homem-do-mau-olhado”, o escritor resgata muitos dos elementos que compõem e descrevem os mitos a trá-los a uma nova luz: à luz do século XXI e a uma breve análise daqueles que foram os maiores acontecimentos dos últimos séculos. Encontramos, escondido, talvez Leonardo da Vinci e os filhos do último Czar, Lumière e o muro de Berlim. Mas mais. Encontramos uma voz que narra histórias sem tempo, sempre no presente, com personagens que não têm nomes próprios.
Poderá parecer que este livro das mitologias sem tempo será vago e confuso. Pelo contrário, caros leitores, este livro é digno de ser apreciado seja de que forma for: garantidamente, e independentemente dos segredos que consiga encontrar, “A mulher-sem-cabeça e o homem-do-mau-olhado” ler-se-á com uma enorme satisfação. E será uma leitura a repetir.
2 Commentários
[…] Adoro o Deus me Livro e, agora, poderão encontrar-me por lá com colaborações pontuais. O primeiro texto é sobre A mulher-sem-cabeça e o homem-do-mau-olhado, de Gonçalo M. Tavares, e poderão encontrá-lo mesmo aqui. […]
Anotado para o comprar, já há muito tempo que não leio aquele que é um dos meus escritores predilectos da atualidade em Portugal.