À primeira vista, “A Vida Peculiar de um Carteiro Solitário” (Clube do Autor, 2014) teria tudo para ser um bom romance. Óptimo, até. Ou, como José Saramago lhe chamaria, um «quase romance.» Porém, tal como a conjugação do verbo “ter” que atrás se utiliza, foi tudo por água abaixo.
A história começa com uma boa base, que mais à frente acaba por se revelar não tão boa: Bilodo é um carteiro que roça a paranóia e a doença mental, com a obsessão de abrir cartas de desconhecidos. Existe a paranóia “ao de leve”, que nos faz embrenhar nas personagens, e existe este tipo de paranoia – é fácil de perceber que o autor é licenciado em psicologia.
Bilodo, com a sua obsessão demente, descobre as cartas de Ségolène, mulher incógnita que apenas escreve “haikus” nas suas missivas. E é aqui que somos confrontados com o fator Murakami (comparação presente na capa) – a influência japonesa sobrepõe-se à arte da boa escrita, pois parece que o escritor quis “despejar” toda a sua pesquisa em efémeras 165 páginas. Bilodo continuará a mostrar sinais da sua excessiva loucura ao longo da narrativa, o autor continuará a pegar em ideias que não resultarão e, quando damos por nós, está o romance (mal) acabado.
Claro que não são só umas quantas más ideias que deterioram uma narrativa. Uma escrita amadora (até mesmo pobre), o uso e abuso de perguntas retóricas e ainda a tentativa de cativar o leitor através de pistas sobre o futuro da narrativa, fazem com que toda a narração se afunde, tal embarcação oshiokuri-bune levada pela Grande Onda de Kanagawa.
Talvez se tenham criado expectativas demasiado altas, talvez não. O veredicto? Um tema comum, que acaba por nada acrescentar ao universo de literatura com presença japonesa. O Genji deve estar a dar voltas no seu túmulo.
2 Commentários
Ótima resenha, opinativa ao invés de simplesmente descritiva. Fiquei intrigado com o tema do livro que vi em promoção. Não sei se vou adquiri-lo, mas se ainda estiver em promoção quando for na loja, acho que levo para conferir.
Estória maçante e chata com um final decepcionante. Não gostei, perdi meu tempo.