Jim Shepard, escritor, professor e historiador norte-americano, moldou-se ao longo do tempo como sendo um romancista que liga algumas das suas obras a factos históricos: “Acidente: Notícias do Dia”, que incide sobre o desastre de Chernobyl e, agora, “O Livro de Aron” (Editorial Presença, 2016), premiado como um dos 10 melhores livros de 2015 pela Amazon e que nos traz a história de uma criança judia, Aron, vítima do holocausto.
Aron e a sua família, à semelhança de milhares de famílias judias, foram obrigados a mudar-se para o gueto de Varsóvia, que mais tarde seria apelidado de “Bairro Judeu”. Acompanhado pelos seus amigos, Aron começou a contrabandear bens e comida, numa tentativa de ajudar as respectivas famílias a sobreviver.
Enquanto a guerra se desenvolvia fora do “Bairro Judeu” já, dentro do mesmo, qualquer edifício em ruína, cave ou carrinho de mudanças eram oportunidades de negócio. Apesar de inocente e talvez sem a exacta noção, Aron descreve a decadência que a vida no gueto oferecia: propagações de doenças, mosquitos, a falta de comida e dinheiro, a discriminação, as proibições levadas a cabo ao longo do tempo e que foram deixando os Judeus cada vez mais limitados em espaço e oportunidades.
“Foram pendurados avisos nos portões para o gueto avisando que este se achava ameaçado por uma epidemia, A minha mãe e o meu pai deixaram de ir a zonas no exterior dos muros e pediram-me para fazer o mesmo. Eu disse que sim e continuei a fazer o que me apetecia onde me apetecia.’’
Já é habitual encontrar literatura sobre a Segunda Guerra Mundial e sobre o Holocausto, alguma dela até relatada na primeira pessoa, como é o caso das obras de Primo Levi ou de Elie Wiesel, que faleceu recentemente. No entanto, a discussão desta temática proporciona sempre uma nova perspectiva quando é feita pela visão de uma criança. Trata-se de uma ficção que podia dar voz a milhares de crianças que foram silenciadas e nunca terão oportunidade de se fazer ouvir. É impossível determinar os futuros que ficaram por construir, os testemunhos que ficaram por registar, as famílias que não se tornaram a unir. As atrocidades cometidas ainda hoje deixam a sua marca, algumas delas para sempre tatuadas nos braços daqueles que sofreram na pele o pior que o ódio e o extremismo podem fazer – mas sobreviveram para o descrever.
Narrativas com este tópico não têm um papel meramente informativo e histórico. A literatura com esta questão da Guerra tem e sempre terá lugar nas prateleiras. Num mundo onde cada vez mais são praticados actos extremistas, é preciso reavivar um passado recente que não deve, de modo algum, ser repetido.
Sem Comentários