Nos dias de hoje e no que toca à literatura policial, a competição tem estado tão renhida quanto o saudoso e épico campeonato Kelvin, com a oferta de títulos situados entre o frio escandinavo e outros climas mais amenos. Isto sem esquecer a reedição de uma das mais incríveis colecções que já passaram pelas livrarias portuguesas – a Vampiro, de que se falará aqui noutra ocasião.
Quantidade, porém, quase nunca é sinónimo de qualidade, pelo que o filão policial encontra, para lá de algumas pepitas e pedras preciosas, muito casquilho e ouro dos tolos. “As Raparigas Esquecidas” (Topseller, 2016), vendido como aquilo que de melhor a Dinamarca tem para oferecer no género policial, fica algures a meio caminho, mas dificilmente poderá ser considerado um grande policial para os amantes do género.
Numa floresta da Dinamarca, um corpo de mulher é encontrado por um guarda-florestal. Com uma enorme cicatriz no rosto, a identificação deveria ser fácil, mas dado ninguém ter comunicado o seu desaparecimento ou não haver qualquer registo desta mulher, a missão começa a ganhar contornos Cruisianos.
Encarregue deste caso está Louise Rick, a nova chefe do Departamento de Pessoas Desaparecidas, que após publicar uma fotografia da misteriosa mulher na imprensa local recebe um estranho telefonema de alguém que diz saber de quem se trata: Lisemette, uma das “raparigas esquecidas” de Eliselund, uma antiga instituição estatal para doentes mentais.
Há, porém, um estranho pormenor que se junta ao caso: Lisemette, bem como a sua irmã gémea, foram declaradas mortas três décadas antes, pelo então médico de Eiselund. E, quando parecia que as coisas não poderiam piorar, uma nova morte e um desaparecimento dão a entender que estamos diante de um assassino em série, que para piorar parece escolher as vítimas de forma completamente aleatória.
A escrita de Sara Blaedel revela muitos ecos Lackberguianos mas, se usa e abusa da componente pessoal e relacional, falta-lhe muita da química, subtileza e negrume que Camilla oferece para lá do cenário de telenovela que habitualmente envolve os seus livros. Eik Nordstrom, o colega de Louise, tinha tudo para ser um enfant terrible, dormindo em bares depois de um apagão total, curando ressacas com um par de shots ou usando o seu charme com um ar meio desalinhado, mas ele próprio vai amolecendo durante a trama.
“As Raparigas Esquecidas” é um policial com muitos tiques de romance, que poderá ser um motivo de contentamento para aqueles que vejam, em Camilla Lacberg, a deusa do policial – mesmo que Sara Blaedel esteja a uns bons quilómetros da sueca. Porém, para aqueles que prefiram algo mais cínico, humorístico ou envolto em nevoeiro e sombras, o melhor será procurar noutra latitude (Jo Nesbo, Gillian Flynn ou até mesmo Karin Slaughter são boas referências geográficas).
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