Mais do que na Música, o território da Literatura é propenso a vistosas escorregadelas, sobretudo se falarmos do livro do meio das trilogias (ou de outras sagas que se estiquem ainda mais). “Alvorada Vermelha”, lançado em 2014 – e publicado pela Editorial Presença em 2015 -, foi um géiser de frescura para os amantes de uma boa história de ficção científica, regado com um cenário distópico que cruzava os recentes “Jogos da Fome” com o espírito visionário de Aldous Huxley e o seu “Admirável Mundo Novo”.
Pierce Brown criou uma sociedade feita de cores, onde as hierarquias e os privilégios eram dados – ou retirados – de acordo com o universo cromático de cada um. A fundação das cores remetia para os tempos em que os primeiros colonos deixaram a Terra para irem viver na Lua, criando uma hierarquia laboral que, com o tempo, foi aperfeiçoada recorrendo à manipulação genética e cirúrgica. O resultado foi a fundação de uma sociedade estruturada por cores, absolutamente eficiente e dominada por uma raça superior: os Dourados.
Nascido Vermelho, Darrow – o jovem herói e protagonista principal da saga – trabalhava nas minas de Marte, suportando um trabalho duro enquanto sonhava com um mundo mais justo, livre da intriga e dos jogos de poder. Quando descobre que a sua casta foi enganada – Marte era já, afinal, um planeta habitável -, Darrow acaba por se transformar, graças aos milagres da ciência e nas mãos de um incrível cirurgião, num Dourado, com o objectivo claro de promover a revolta das castas mais baixas da sociedade.
Em “O Filho Dourado” (Editorial Presença, 2016), Pierce Brown leva o nível de entretenimento para um patamar superior. Se “Alvorada Vermelha” serviu para mostrar o mundo e a sociedade através de um jogo literário semelhante a uma construção de Lego, “O Filho Dourado” destrói tudo isto com muito estilo e malvadez.
Agora com 20 anos, Darrow vive tempos difíceis. Se por um lado parece ter conquistado o respeito dos deuses, quanto aos mortais a história é bem diferente. Com o afastamento estratégico de Augustus, Darrow rapidamente terá a cabeça a prémio – ainda que por via de canais não oficiais -, tendo de recorrer a toda a sua criatividade e espírito de improviso para virar a mesa para o seu lado.
Para além de personagens bem desenhadas, Brown tem um toque mágico para intercalar cenas de acção frenética, violência a rodos e discursos sobre liberdade capazes de comover o coração mais empedrado. Que o festim continue no terceiro e último livro.
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