Algo fundamental nos povos civilizados da sociedade contemporânea, é estarem munidos de um conhecimento profundo sobre a História do seu País, os alicerces base da formação da sua Nação e as características pessoais do lote de figuras históricas que foram imprescindíveis na construção do mesmo – e cuja vida se mistura com o passado da pátria em questão.
Em “100 heróis e vilões que fizeram a História de Portugal” (Marcador, 2016), são dadas páginas e destaques importantes não apenas a alguns dos maiores e mais notáveis portugueses de sempre como, também, são chamados à enumeração figuras que a larga maioria dos portugueses desconhece.
A história da monarquia portuguesa – e de cada rei individualmente – é passada a pente fino: as suas aptidões, ideais, as infidelidades e promiscuidades, as constantes fuga da Corte para o Brasil, as alianças com outras nações e os feitos que fizeram a prol da nação são dissecados por Pedro Rabaçal.
Mitos urbanos do passado são convocados para constar da lista dos cem heróis, desmitificando-se assim, por exemplo, a origem do Sr. Roubado, para muitos uma mera paragem na linha amarela do metropolitano de Lisboa, mas que se trata na verdade de Antonio Correia que, aos 19 anos – e a 11 de Maio de 1671 -, assalta uma igreja em Odivelas, (“O Divino Senhor Roubado/Nos livre da culpa e do pecado”).
Além de ficarmos mais enriquecidos ao nível do conhecimento histórico, somos levados para um passado muito distante que permite traçar paralelismos sobre a vida geopolítica dos nossos dias, pois neste livro são referidos inúmeros casos de relações próximas da Realeza Portuguesa com outras cortes do panorama Europeu, nomeadamente em latitudes anglo-saxónicas. Além disso – e com fina ironia -, o autor sarcasticamente constata que há hábitos que nunca mudam, como ao discorrer sobre D.João IV e a sua visão de Portugal: “sempre se preferiu gastar fortunas em luxos inúteis em vez de as investir (…)”.
Associando os nobres a uma distinta carreira militar, Pedro Rabaçal disserta sobre vários casos de infidelidade – hábito aceite na altura – e enumera casos de filhos bastardos, como o de João III, o impiedoso, ou ainda D. Filipe I que, aproveitando o facto de ser um homem atraente, pôde cortejar damas de todas a Europa. É feita ainda, com exaustão, um escrutínio intenso, seja das actividades militares do Duque de Alba, próximo de Carlos IX, que participou em guerras contra França, Espanha ou contra 0os protestantes alemães, as vitórias de Pedro II contra os castelhanos ou, ainda, a batalha de Matapão de 1717, que opôs tropas lusas lideradas por D. João V contra o Exército Otomano.
Não são deixadas de parte as perseguições da igreja – sobretudo por blasfémias – durante os séculos passados, sendo essa fatalidade ilustrada no livro pela prisão de Damião de Gois, em 1571 – acusado de heresia – ou de Manuel Batista Peres, em 1635. É também dado um destaque importante à vida do Padre Antonio Vieira, sendo-lhe atribuídos alguns parágrafos onde se destaca a sua detenção por parte da Inquisição, devido à sua tentativa de descobrir sangue judeu. A pena a pagar por este? Impediram-no de pregar! Há também o cuidado de referir a importância dos efeitos da Inquisição – criada sobretudo devido à heresia luterana – no atraso do pensamento crítico da sociedade portuguesa de outrora.
Ao ler a descrição das cem figuras que constam da obra, temos oportunidade de reflectir e criar ligações sobre a forma como a nação portuguesa terá evoluído na sua postura e costumes. A dada altura, várias páginas são dedicadas a Sebastião José de Carvalho e Melo, vulgo Marquês de Pombal, considerado com justiça como um dos grandes portugueses de sempre. Rabaçal reforça a sua vertente inovadora, de alguém que já na altura considerava vital para o país uma forte mudança de mentalidades, sobretudo quando comparadas com outros povos europeus. No livro dá-se ênfase ao mérito de Pombal em ter desenvolvido a classe mercantil, colocando-a ao nível da concorrência estrangeira.
Muitos anti-heróis e figuras menos consensuais são destacadas neste livro: Gomes Freire de Andrade, Miguel de Vasconcelos, D. Carlota Joaquina e, como não podia deixar de ser, o Professor Antonio d’ Oliveira Salazar – e, neste caso em particular, mérito para o autor que não se inibe de classificar o professor oriundo de Santa Comba Dão como um ditador autoritário.
“100 heróis e vilões que fizeram a historia de Portugal” é um documento importante, significativo e digno de registo para aqueles que não se inibem de reunir fragmentos do passado do nosso País.
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