26 de Novembro de 1985. É esta a data que assinala a primeira referência da imprensa portuguesa aos Mão Morta, numa entrevista a Fernando Sobral do DN intitulada “Somos todos ex-suicidas”. Isto três dias após a banda ter tocado no 1º Concurso de Nova Música Rock, que decorreu na bela Invicta. No ano seguinte a banda apresentava-se no Rock Rendez-Vous, em Lisboa, no III Concurso de Música Moderna, onde acabaria por obter o Prémio de Originalidade que, no ano anterior, havia sido muito bem entregue aos Pop Dell`Arte. Em 1988, e depois de um ano anterior carregado de concertos, é editado o primeiro e homónimo disco, considerado por muitos como o melhor disco nacional do ano. Começava assim um percurso de sucesso, de uma banda que conheceu vários momentos e abordagens e que, da sua formação inicial, mantém apenas dois elementos: Adolfo Luxúria Canibal, vocalista e letrista, e Miguel Pedro, baterista, programador, compositor e produtos.
Editado em 2004, “Narradores da decadência” – da autoria de Vítor Junqueira – relata exemplarmente a carreira desta banda bracarense, que revolucionou a música portuguesa em vários dos seus momentos. Agora, chega a vez de a carreira da banda ser mostrada à luz da imprensa portuguesa, com a publicação do álbum de recortes “Revista de Imprensa – Os Mão Morta na Narrativa Mediática (1895-2015)” (Abysmo, 2016), mais uma grande edição que conta com o selo da Abysmo.
É o próprio Adolfo que, no prólogo, fala do que mora dentro destas páginas, que surgem encadernadas numa fantástica capa dura, onde uma mão branca, qual assombração, serve de enquadramento às letras gravadas a vermelho, quase como se estivéssemos dentro de um conto de Edgar Allan Poe: uma sequência de “recortes, embrenhados no espírito da época e com a espontânea reacção e análise do momento”, que compõem “uma narrativa com uma animação e um colorido diferentes dos da biografia clássica”.
Trata-se de uma história escrita a várias mãos, a partir do arquivo pessoal do próprio Adolfo Luxúria Canibal, feito de “entrevistas, críticas a discos, reportagens de concertos, notícias, balanços anuais ou temáticos, capas, chamadas de primeira página e uma miríade de outras menções pelos mais variados motivos.”
Aqui se encontram alguns ícones da imprensa musical portuguesa como Jorge Pires (Blitz), Luís Maio (Blitz), António Pires (Blitz), Ricardo Saló (Expresso), Isilda Sanches (A Capital), Miguel Francisco Cadete (Blitz), João Lisboa (Expresso) ou Rui Miguel Abreu (Se7e), ou mesmo as palavras escritas por um dos maiores escritores nacionais da actualidade: Valter Hugo Mãe. Não falta também a histórica entrevista de Pedro Ayres Magalhães para O Independente, corria então o ano de 1988.
Percorrendo a história da imprensa ao longo de 30 anos, Adolfo Luxúria Canibal mostra-nos aqui uma outra forma diferente de se olhar a história, com uma multiplicidade de olhares de diferentes gerações centrados numa das mais marcantes, inventivas e revolucionárias bandas que fazem parte da música nacional. Para além da cor, transmitida através de três desdobráveis que mostram capas de jornais, bilhetes de concertos ou flyers promocionais, o preto e branco das fotografias de José Pedro Santa Bárbara faz-nos mergulhar num mundo feito de escuridão e sombras. Afinal, os tons com que os Mão Morta pintaram o mundo.
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