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Vodafone Paredes de Coura (16 Agosto): os extra-terrestres são nossos amigos

Por Pedro Miguel Silva · Em 24/08/2019

No ano da graça de 1973, o ex-jornalista desportivo francês Claude Vorilhon, Raël para os amigos, afirmou ter estabelecido contactos com extraterrestres em diversas ocasiões, explicando a criação dos humanos como sendo obra dos Elohim, uma raça semelhante ao ser humano que usou o seu próprio ADN para criar uma versão mais ligeira de si mesmos. Não sabemos qual terá sido o dealer mágico que Claude terá encontrado e que lhe abriu as portas para uma dimensão paralela mas, tendo de arriscar aquilo que mais vai passando pelos seus headphones e outros dispositivos musicais, arriscaríamos um nome de olhos fechados: os Spiritualized.

Liderados por Jason Pierce, a chegada dos Spiritualized a Paredes de Coura esteve ao nível de um fenómeno com o selo Roswell: pousaram a nave de mansinho, fizeram análises ao solo, ao ar e à agua, raptaram um ou outro espécime para observação futura e saíram sem fazer grande alarido, pegando logo a seguir naquele dispositivo dos Men In Black para tentar apagar a memória dos que tinham ficado, siderados, à espreita por entre a folhagem.

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Com o seu estilo rocker em introspecção, Jason Pierce assumiu o papel de um Rachmaninoff da guitarra, sentando-se diante de uma pauta, de perfil para o público, lugar onde permaneceu durante todo este concerto, nunca encetando diálogo com a espécie que veio observar – mas à qual, no final, agradeceu e muito.

No palco, no centro deste buraco negro da existência que são os Spiritualized, está uma banda de compinchas que ajuda a alimentar este sonho sónico de proporções épicas, destacando-se o coro sublime de um trio nada angelical, numa catarse musical que tanto ajuda a embalar como aponta ao sangramento dos canais auditivos.

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Em 2008, Jason Pierce foi hospitalizado com pneumonia. Os pulmões ficaram cheios de líquido e o coração, esse malandro, parou por duas vezes, mergulhando-o numa inconsciência que viria a resultar no disco “Songs in A&E”. Já em 2012, o músico partilhava com o mundo ter o fígado num caco, resultado de duas décadas onde experimentou tudo o que havia para experimentar no que a drogas dizia respeito. Sujeitou-se de boa vontade a um tratamento que envolvia uma injecção semanal e a toma diária de uma série de comprimidos, numa residência forçada que o levou a escrever um disco baseado nestas novas drogas, é certo que menos excitantes mas recebidas com avidez pelo corpo: “Sweet Heart Sweet Light”. Já em 2018, chegou às lojas que ainda vendem discos e plataformas digitais “And Nothing Hurts”, onde a música parecia, de alguma forma, ter conseguido domar os seus demónios e paixões, entre baladas de fazer chorar o coração mais pedregoso e temas capazes de fazer sangrar os ouvidos de um surdo.

É precisamente neste limbo entre a vida e a morte, a euforia e a ressaca, a calma e a arritmia, que Jason Pierce tem criado a sua ópera rock espacial, acordes que parecem chegar de outra dimensão, letras que, de tão bem escritas, conseguem tocar-nos o centro da alma. Canções de quem está permanentemente na corda bamba, com o corpo ligado às máquinas e as linhas num constante desarranjo, à espera que venham bater no ombro e dizer que a viagem chegou ao fim.

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Neste concerto que alcançou a perfeição, os trinta anos dos Spiritualized foram espremidos através do rock de proporções épicas de “Come Together”, do hino à solidão que é “Shine a Light”, desse piscar de olho ao enrolanço que é “Let`s Dance”, da aura transcendental e arranjos grandiosos de “Sail On Through”, ou da versão de “Oh! Happy Day”, que foi da escuridão cerrada à luz tranquilizadora. Não sabemos dizer se os Spiritualized são ou não a melhor banda do mundo, mas nesta noite bateram qualquer concorrência aos pontos.

Tal como quando aconteceu quando aterrou, a nave de Pierce levantou vôo de mansinho, fez-se à estrada cósmica e levantou, por instantes, a poeira da criação. Para trás ficou um concerto que foi, como tão bem se canta neste disco, a perfect miracle. Sorte danada a dos que lá estiveram.

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Foi com a moral em alta que os First Breath After Coma pisaram o palco principal em Paredes de Coura, falando, logo a abrir, de “um sonho realizado“, no lugar onde tinha começado a sua vida de festivaleiros. Poucos dias antes e na companhia de Noiserv, a banda de Leiria havia dado cartas no Bons Sons, numa joint venture sobre a qual escrevemos estas linhas: “A união entre os First Breath After Coma e Noiserv foi mais do que um romance de verão, e muitos foram os que exigiram o casamento depois de terminado o descarado flirt de palco. Uma setlist escolhida a dedo, um jogo de luzes irrepreensível, humor, uma incrível dinâmica de palco e um concerto que fica para a história dourada desta edição. Foi bonito, rapazes“.

Aqui, mesmo sem o poder encantatório das luzes, a banda apresentou os temas do seu mais recente “Nu”, como “Feathers and Wax” – aquele cruzamento entre James Blake, Bon Iver e guitarras em desvario – ou “I Don`t Want Nobody” – “uma música feita pelo Rui às três da manhã“, não esquecendo hits para cantar de peito aberto como “Salty Eyes”, conseguindo o feito de criar um elo com um público que decididamente sabia ao que vinha: uma banda que navega entre o sonho e a inquietação, a timidez e o desafio, a sombra e o passeio debaixo de um sol abrasivo, mudando de pele quando é preciso em busca de fazer evoluir o seu post-rock de assinatura.

A surpresa maior ficou guardada para o final, quando a banda discursa sobre “uma residência artística, de onde saíram umas versões novas de um e outro lado“, preparando a entrada em cena de David Santos, aka Noiserv, que pegou na guitarra para juntar mais uma camada ao belíssimo “Blup”, do majestoso “Drifter”, e que acabou por actuar como maestro e líder vocal no seu “Don’t Say Hi If You Don’t Have Time for a Nice Goodbye”. Um casamento que se quer para vida e de onde sairá, certamente, uma tour conjunta – ou, pelo menos, uma rodela colaborativa.

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Na sua primeira passagem por Portugal, os Balthazar mostraram ter muito estilo e, sobretudo, uma pop que acrescenta irrequietude aos muitos ecos que vão chegando com o desfilar de temas convidativos ao abanão: “Blood Like Wine” quase que poderia ser um tema dos Prefab Sprout, cantado por um Shane McGowan com os dentes arranjados – até à chegada de um coro que fecha a loja em modo boys band; “Never Gonna Let You Down Again” evoca o espírito dos The The, acrescentando-lhe um extasiado coro em falsete; “Fever”, da nova rodela, poderia bem ser uma malha dos Franz Ferdinand, se estes tivessem decidido crescer de forma diferente. Um concerto a pedir o regresso descarado – já agora, o LAV seria o lugar perfeito.

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Quem se parece ter divertido à grande, tanto que tem já regresso marcado para a edição de Novembro – toca a 15 – do Festival para Gente Sentada, foi Jonathan Wilson, que aqui nos trouxe a sua trippy e muito particular instalação de Trafalgar Square – o tema que deu início à viagem -, num universo sonoro onde cabem delícias pop, slides de guitarra a par de vídeos que poderiam servir de promoção ao jogo SIMS, valsas eléctricas com solos de fazer corar Santanas e Claptons, passeios guiados pelo deserto, malhas de piano a fazer lembrar – e muito – os The War On Drugs, ecos de Pink Floyd com as rotações maradas, pedidos de namoro à boleia de um tutorial sobre posições yoga para ele e para ela, resultando num cocktail acompanhado por um daqueles chás artesanais que se tomam no conforto de casa antes da saída para uma festa de arromba. Peace, Jonathan.

 

Fotos: Hugo Lima

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Pedro Miguel Silva

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