“É o baixista mais cool alguma vez a caminhar pela face da Terra, ponto final”. O autor da frase é o guitarrista e cantor dos The Internet, Steve Lacy, falando sobre Thundercat. E quem é este baixista com nome de desenho animado?
Stephen “Thundercat” Bruner construiu a carreira com base na versatilidade – já tocou com mil e um nomes bem diferentes, dos Suicidal Tendencies a Snoop Dog, de Erykah Badu a Kamasi Washington. Foi, também, um dos arquitectos de “To Pimp a Butterfly”, o álbum-charneira de Kendrick Lamar que marcou o ano de 2017, e cuja temática é hoje mais actual que nunca. Resumindo, o seu nome é presença habitual em muitos movimentos tectónicos da música recente.
A solo, o músico de culto já vai no quarto lançamento: o trabalho mais recente chama-se “It Is What It Is” (Brainfeeder, 2020). A inspiração maior está em géneros como o funk dos anos 70, a soul, o disco-sound mais cintilante, o jazz experimentalista e as gordas batidas do hip-hop. A estes sons acrescenta-se o fascínio pelo jogos de computador, a anime japonesa e o culto do Dragon Ball Z.
Como seria de esperar, esta salada sonora apresenta-se como um fogo de artifício colorido, a disparar em todas as direcções. Thundercat é um executante habilidoso, e isso ouve-se em vários momentos do disco: na audaciosa linha de baixo de “How Sway”, por exemplo, atinge velocidade warp. O mesmo acontece em “I Love Louis Cole” – começa com umas cordas majestosas, antes de receber uma injecção de energia punk que o faz disparar a toda a brida, com a ajuda preciosa do beat acelerado de Louis Cole.
De seguida abanamos a anca ao som do muito funky “Black Qualls”, jeitosa colaboração com Steve Lacy, Steve Arrington e Childish Gambino. Noutros pontos o baixo transpira sedução, como na balada “Unrequited Love”, ou na sonolenta “King of the Hill”, colaboração com os figurões do jazz BADBADNOTGOOD.
A produção, a meias com o cúmplice habitual – o músico e produtor Flying Lotus -, tem os seus momentos menos bons. Em alguns pontos surge embotada, algo liquefeita – como em “Innerstellar Love”; noutras músicas acerta-se na mistura e afinam-se, com sucesso, as texturas sonoras. É disso exemplo a cristalina “Funny Thing”, animada por sintetizadores subtilmente psicadélicos.
As cinco últimas músicas mostram Thundercat numa disposição mais sombria. Reflectem o desânimo e a impermanência que parecem ter assentado com força nas costas do músico, com a morte do jovem rapper Mac Miller, seu grande amigo.
“It Is What It is” é um disco onde cabem muitas ideias em corrupio. Talvez por isso algumas passagens soam algo inconsequentes ou mal-cozinhadas – veja-se o monólogo cómico de Zack Fox, em “Overseas”, por exemplo. Só que os momentos bem sucedidos também são muitos: vários temas acertam no alvo, e quando isso acontece é um prazer percorrer o universo delirante do excêntrico Thundercat.
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