Sete anos depois de “Cavalo”, primeiro longa-duração lançado em 2014, o brasileiro Rodrigo Amarante brindou-nos com “Drama”, um disco herdeiro do movimento tropicalista – ou, se preferirem, Tropicália – que, na segunda metade da década de 1960, trouxe à música brasileira algumas inovações estéticas e uma certa efervescência política, fundindo a música tradicional brasileira com sonoridades que iam chegando de diferentes geografias planetárias.
Feito de arranjos sumptuosos, “Drama” soa como um daqueles discos que parecem não ter idade, avessos a plásticas ou que recusam, julgando durar para sempre, cremes reparadores. Uma rodela onde a pop, o rock ou a folk se vão cruzando e no qual, sem nunca perder o embalo Strokiano, Rodrigo Amarante funde as tradições da música brasileira com o abanar de anca da América latina, juntando-lhe uma minúcia de artesão que nos faz viajar entre a melancolia e a excitação. Foi por isso grande a surpresa quando, após uma abertura de Naima Bock da qual já ninguém se lembra – ou fez tudo por esquecer -, um solitário Rodrigo Amarante subiu ao palco na companhia de um brilhante e branco violão, que perante o imenso vazio quase tinha o ar de um brinquedo. Num Capitólio esgotado e pronto para fazer a festa, a Tropicália viu-se chutada para canto e, no seu lugar, tivemos um Rodrigo Amarante em modo unplugged. O resultado, depois do mais que necessário reajuste emocional, chegou a ser tocante mas sem ponta de drama, um arrojado strip musical que, ainda sim, não dispensa o regresso devidamente acompanhado.
«Vocês vieram!», atirou Amarante antes de se lançar a “Evaporar”, tema do único disco lançado pelos Little Joy, banda do qual fez parte e que convidava os Strokes a um passeio pelo Ipanema em cima de umas arejadas havaianas.
Numa noite em que, como que prevendo o fim do Carnaval sanitário, já muita gente tinha desistido da máscara, o artista brasileiro recordou os tempos difíceis pelo qual passou muito boa gente dedicada ao oficio musical: «Tou meio bobo. Fiquei sem meu trabalho durante três anos”.
O público não deixou de ir preenchendo os espaços vazios, fosse com assobios ou na na nas em “Nada em Vão”, ou na envolvência de “Maré”, que valeu o elogio do músico com vernáculo tuga à mistura: «A gente nem precisa de ensaio. É sonho, é destino. Valeu. Vocês ensaiaram antes de eu chegar? Foda-se….». Agradecimentos distribuídos ao longo da noite, relembrando as caras conhecidas que ali estavam – «Tenho muitos amigos aqui hoje. Tou tentando não pensar nisso» – ou aquele momento cósmico que levou um mar de gente ao Capitólio – «Em algum momento, todos vocês pensaram em vir esta noite e dar uma chance ao Rodrigo». A certa altura já ninguém queria saber do ar minimalista da coisa, e o próprio Rodrigo já se sentia em casa, pedindo para desligar «o fabricante de névoa» e outros artifícios que só lá estavam mesmo para fazer número.
“Um Milhão” foi momento de política social em estado de graça, um hino contra todas as injustiças; “Irene”, futebolisticamente falando, show de bola; “Tardei”, um western carioca que teve direito a vénia perante um coro esmerado.
«E agora?», pergunta Rodrigo Amarante depois de voltar para o primeiro encore, recebendo, depois de várias sugestões, a melhor das respostas: «Toca aquela!». A escolha recaiu em “O Vento”, faixa de Los Hermanos, mas houve ainda tempo para dois outros encores de uma música só. Primeiro com “Pode Ser”, «uma música que escrevi para uma orquestra» – a Orquestra Imperial -, depois, quando já alguns se tinham posto ao fresco, com o clássico “Deusa do Amor”, para o qual Moreno Veloso subiu ao palco para se juntar a Amarante. Ah, ah, ah, ô, ô. Ah, ah, ah, ô, ô.
Alinhamento:
Evaporar (Little Joy)
Tara
Tango
Nada em Vão
O Cometa
Tuyo
Um Milhão
Maré
The Ribbon
Irene
Tardei
Encore
O Vento (Los Hermanos)
Encore 2
Pode Ser (cover de Orquestra Imperial)
Encore 3
Deusa do Amor (com Moreno Veloso)
Fotos gentilmente cedidas por: Luís Sousa / Música em DX
Promotora: Sons em Trânsito
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