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Pedro de Tróia | “Depois Logo se Vê”

Por Pedro Miguel Silva · Em 09/03/2020

A bordo de uma nave espacial, assinou com os Capitães da Areia um dos discos essenciais da música portuguesa da última década, algures entre o descomprometimento e o conceptualismo, percorrendo o universo quase de uma ponta à outra ao mesmo tempo que tratava de revisitar – e de homenagear – boa parte da cultura musical portuguesa. Um disco para dançar, feito de acordes inconscientes, teclados em ebulição – ou em combustão -, batidas em delírio líquido e refrões para serem cantados e partilhados com os vizinhos de cima e de baixo que, sendo tremendamente divertido, teve de ser levado muito a sério. Algo como um monumento pop com a forma e o fascínio de um pequeno rectângulo desenhado à beira-mar.

Cinco anos depois já não temos Capitães, mas a viagem de Pedro de Tróia continua a escrever-se com ecos de portugalidade – e com o Capitão da Areia Tiago Brito na produção. “Depois Logo se Vê”, a sua primeira aventura em nome próprio, é uma confissão em estado pop, um retrato da falha e da busca pela redenção, ansiando por dias claros que teimam em não chegar. Neste exercício de terapia musical abraça-se o lado parvo do amor e da vida, que os Capitães tão bem souberam explorar e que Tróia transporta aqui para uma vertente mais emocional e pessoal, mostrando-nos as suas inseguranças e ansiedades agora que os trinta – os seus trinta – se instalaram.

Com Embaraçado, o Verão Azul volta a entrar-nos casa adentro, com todos os embaraços da infância e da adolescência – alguns deles pequenos gladiadores que teimaram em fazer parte da vida adulta. Recorda-se o primeiro amor para os lados de Pedras D`El Rei, extinto como o eram os castelos de areia abalroados pelo mar. Tudo com a musicalidade de um slow efervescente, para se poder dançar na timidez que é devida.

Teclados que poderiam habitar em Stranger Things transportam-nos até aos braços de uma Salvadora, num encontro marcado com a ajuda de um coro que promete um incêndio nocturno na cidade.

Em Óculos de Sol não há mesmo volta a dar: é vestir o biquíni ou enfiar os calções de banho e ir curtir com os pés na areia, enfrentando o escaldão de sorriso no rosto e sentindo o encanto da foleirice no amor, deixando que a claridade e o sabor a chocolate, meloa ou doce de leite possam levar para a frente o namoro.

Nunca Falo Demais faz uma entrada a pés juntos com Future Islands, mas é mesmo só para enganar. A bola de espelhos começa a rodar e as purpurinas saltam à vista, numa confissão que pede a quebra do silêncio. Exige-se dança, impõe-se o abanar de anca, inventa-se um novo mantra: “Quem me julga só se aborrece”.

“Imagina que morremos depois deste take”, ouve-se no início de Rés do Chão, e por momentos parecemos estar ainda a bordo da nave dos Capitães. Um tema belíssimo, onde o desejo é o de atirar para trás das costas com uma vida de cão e dez anos a dormir no mesmo desconfortável colchão, com a vida a não devolver nem um quartinho daquilo que se deseja ou por que se vai lutando. Maldiz-se quem nasceu de cu virado para a lua e fazem-se figas para que um dia se possa viver num último andar, com um terraço onde dê para abrir os braços e entrar sem medo ou vergonha em gigantismos. Uma canção dominada por uma guitarra acústica que pede um isqueiro aceso do princípio ao fim.

O bem-me-quer mal-me-quer vê-se substituído por um Dente de Leão, num sentido de inspiração que obriga a levantar o corpinho da cama, a mantê-lo acordado até altas horas e a pedir que um artesão possa surgir para juntar os fragmentos dispersos numa cura profética. Vai-se ao fundo da ilusão e regressa-se para bater de novo à porta da vida, deixando despreocupadamente a chave no bolso. Os teclados que se vão ouvindo parecem estrelas cadentes, com um coro espacial a embrulhar em papel brilhante esta busca incessante pela inspiração.

Pedro de Tróia, Depois Logo se Vê, Disco, Deus Me Livro, MusicboxEm Passos Lentos mora um coração que adormeceu num copo de água ardente depois de uma jura de amor eterno. Luta-se por (voltar a) ter borboletas a morar dentro da barriga, oferecendo cactos em vez de um amor-perfeito, mesmo que o andar pareça ficar cada vez mais pesado. Mas talvez o amor seja também isso: aceitar as imperfeições, a lentidão. É quase um samba com as rotações trocadas, um caribe no marinanço, um slow que vai decrescendo até acabar num tímido sussurro.

Meia Hora é mais um momento de acalmia, agora com a guitarra a ganhar alguma electricidade. Entra-se na relação de peito aberto, dando e recebendo, negando e recebendo a nega de volta, aceitando o presente e não querendo saber daquilo que o amanhã reserva.

E como fazer que os dias passem mais depressa e que se consiga sair do armazém da memória – ou, pelo menos, mudar o que de errado se fez? Aceita-se o erro, fazem-se desvios para evitar as sombras do meio dia. Ela não vem e a pergunta que se faz é esta: e agora? Vençam-se as memórias, finte-se a dor.

A terminar passeamos Por dias claros, onde uma bateria com ar marcial dá início a uma elegia fúnebre, lida por quem deixou de ter a luminosidade por perto. O tempo aqui é de oração, o balanço que se faz é quase o de uma vida inteira, aceita-se que talvez a redenção e a bonança só cheguem mesmo no fim disto tudo.

“Depois Logo se Vê” é um disco que nos põe a olhar para a vida adulta com o olhar tímido da infância e a inquietação da adolescência, fazendo-nos sonhar com um namoro que venha sem grandes formalidades e muita dança. Dancemos pois.

—

Pedro de Tróia apresenta “Depois Logo se Vê” a 13 de Março no Musicbox, em Lisboa. Os bilhetes podem ser adquiridos aqui.

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Pedro Miguel Silva

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