Sábado, 3 de Fevereiro de 2018. Pouco depois das 21 horas, Shahryar Mazgani toma conta do palco do Pequeno Auditório do CCB. Sorridente, agradece a ovação com uma vénia. Veste um fato escuro e uma camisa branca – sob um intenso foco de luz, dir-se-ia um maestro prestes a iniciar a sua sinfonia. Os dois guitarristas, Manuel Dordio e Pedro (Peixe) Cardoso, acompanham-no na interpretação de “The Faintest Light”, delicada canção de embalar que encerra o quinto álbum de originais, “The Poet’s Death”. São precisos pouco segundos para sermos conquistados pela sua voz cálida e serena.
O mais recente álbum de Mazgani tem esta faceta tranquila, lunar, um sentimento de assombro e esperança que se insinua lentamente nas letras e nos arranjos minimais. É nestes terrenos que prossegue o espectáculo, primeiro com “Bible Black”, depois voltando ao álbum de 2013, “Common Ground”, para tocar a fantástica “Absent Lover”.
Há no entanto um outro lado de Mazgani, que se revela com grande intensidade em palco. As cordas e registos da alma do cantor não fogem ao negrume e, muitas vezes, o toque hábil e delicado dá lugar ao grito vulcânico. Mazgani é um mestre-de-cerimónias apaixonado, e vive as emoções até ao limite da sua voz. Foi assim com “The Traveler” – aquele riff de guitarra é um achado – e “The Poet’s Death”, duas músicas que funcionam muito bem ao vivo. Um dos melhores temas de “The Poet’s Death”, “Breath of Gold”, contou com um arrebatador solo de guitarra de Peixe, tornando-se ainda mais poderoso e visceral.
Igualmente arrebatador foi “Mercy”, de “Common Ground”, interpretado a solo por Mazgani com a guitarra à deriva num mar de distorção, num registo telúrico que deixou as paredes do CCB à beira da derrocada, presas pelo poder encantatório da voz do luso-iraniano.
Mesmo nas músicas mais calmas sentia-se uma energia latente – como em “Rebel Sword”, uma balada que foi uma tempestade tranquila em lume brando, ou “Dust in The Sun”, enfumarada invocação do espírito de Leonard Cohen.
Entre músicas, houve um diálogo descontraído com o público – em contraste com o arrebatamento das interpretações, Mazgani foi afável, auto-irónico e bem-disposto: “Não aceitamos menos do que glória”, dizia com ironia, pedindo aplausos à plateia lotada do CCB.
De salientar a qualidade de todos os músicos em palco: qualidade nas guitarras de Manuel Dordio e Peixe, verdadeiras forças vivas; qualidade na bateria de Isaac Achega, uma formidável máquina de ritmo – “a nossa locomotiva”, como dizia Mazgani -; qualidade também nas sólidas linhas de baixo de Vitor Coimbra. Com todo este talento, Mazgani manobrou as alavancas para levar o espectáculo a bom porto.
O encore fez-se com “Blow Wind”, tema sob a órbita e influência de PJ Harvey, que é, com Cohen, uma das pedras-de-toque do cantor. Seguiu-se um final em apoteose, com Mazgani a pedir ao público que se chegasse à boca de palco, para depois percorrer o centro da plateia ao som da enérgica “Strike Your Drum”, enquanto o assistente de palco empreendia uma batalha esforçada com o irrequieto fio do microfone.
Setlist:
The Faintest Light
Bible Black
Absent Lover
Send The Word
The Poet’s Death
Dust in The Sun
Your Voice Grows Dry
Rebel Sword
The Traveler
Breath of Gold
Loving Guide
Mercy
Broken Tree
Encore:
Blow Wind
Strike Your Drum
Galeria Fotográfica (Fotos de Luís Miguel Andrade)
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