6 anos durou o mais longo hiato entre os álbuns de originais de B Fachada. Em compensação, “Rapazes e Raposas” é o disco mais extenso e ambicioso da carreira de Bernardo Cruz Fachada.
Ainda agora voltou e B Fachada já anuncia que não vem para ficar: “Eu não sou daqui / venho a passar / para a matiné / não vou ficar”, avisa na última canção. Pois bem, comecemos exactamente pelo fim – o tio B não é deste planeta. Nem ele nem eu, tu, ela, nós, vós, eles. Despreocupado, é na senda da extinção que B encolhe os ombros sobre a nossa efémera condição. Afinal de contas, e segundo narra no fado-fábula d’A Mula e a Raposa, “Vai dar ao mesmo tanto faz o animal / Depois do mundo o universo fica igual”.
Quem conhece o repertório “fachadês” sabe que de dadá ao niilismo é um passinho. O peso da notoriedade e/ou a responsabilidade parental parecem, no entanto, ter trazido à viola braguesa mais eloquência e ao bloco de notas uma coerência singular. De olhos postos no futuro, Fachada aponta para Prognósticos pessimistas; olhando para trás, culpa os costumes nefastos dos avós (“São meus os teus enganos / tens que me perdoar”) e, em nome do presente, sugere Mudar de Método. Porém, nem tudo é assunto sério e, como manda a tradição, há no disco bastante espaço para a natureza, amor, sexo e família. É, aliás, ao seio doméstico, o seu “ermitério”, que Fachada se dedica com afinco, tal relata Trad-Mosh: “Quero toda a gente a rir / é nisto é que o papá é boss”.
Não fosse um álbum de originais, “Rapazes e Raposas” podia bem ser uma compilação de êxitos. O fã mais atento descobrirá paralelismos entre a musicalidade das novas canções e a discografia do artista – repare-se, por exemplo, na Aritmética de alusão a Diabo na Cruz, a declaração de intenções Anti-Fado à la deus, pátria e família, o folclore característico de Namorada, a crueza perdida de Natureza Radical, o retorno da balada em Mínima Atenção e o exotismo vibrante de Padeirinha.
Está visto que B Fachada não publica obras para marcar passo. Desta feita, esculpiu uma das jóias mais brilhantes do seu valioso acervo. Que continue por muitos anos a fazer o que melhor sabe – propagar a sua existência através da descendência e da enorme influência que exerce na música contemporânea portuguesa.
1 Commentário
Estamos perante,Sem qualquer dúvida,a uma quase simbiose analítica , resultante de dois trabalhos excelentes, que ,com objetivos diferentes, alcançam com Mestria e caráter (bom) os objetivos preconizados. Parabéns B Fachada, parabéns João Miranda.