Mais ou menos a meio do concerto da passada quinta-feira, na Sala Lisboa ao Vivo, um homem aproxima-se do palco com passos largos e decididos e dá um valente aperto de mão ao cantor Mathew Houck. Foi a expressão de uma ligação especial que o artista, também conhecido como Phosphorescent, forjou com o público nessa noite.
Houck anda a promover o mais recente registo da banda, o excepcional “C’est La Vie”, de 2018, e o concerto de Lisboa foi o último da digressão europeia. A sala estava pela metade, mas os músicos não se deixaram abalar, oferecendo uma performance que agarrou pelos colarinhos todos quantos lá estiveram.
O cantor não é um vocalista convencional – não ganharia nenhum Ídolos ou Operação Triunfo e, no entanto, é o exemplo perfeito de um artista que tira o melhor partido dos atributos que tem. A sua singular voz combalida cria uma atmosfera umas vezes calorosa, outras sombria, e ao vivo a sua presença descontraída soa sempre genuína e emocional.
Atrás dos teclados, com uma postura tranquila, Jo Schornikow – mulher do vocalista – fazia lembrar uma esfinge, se uma esfinge fosse capaz daqueles solos magistrais. O outro teclista, Scott Stapleton, dono de uma impressionante juba metaleira, deu espectáculo ao longo da noite em temas como Tell Me Baby (Have You Had Enough) e Nothing Was Stolen, mais musculadas na versão ao vivo – enquanto o público também vibrava entusiasticamente.
Não faltaram pontos altos: a mais conhecida Song for Zula foi muito bem recebida; Around The Horn virou a agulha para o lado do rock psicadélico, uma interpretação incendiária que deitou a casa abaixo; At Death, A Proclamation foi uma fabulosa explosão controlada; Christmas Down Under e My Beautiful Boy espalharam a vibração tropical e arejada do último disco.
É curioso como temas que em disco soam tão melancólicos se transformam, na versão ao vivo, em hinos entusiasmantes. A banda é exímia no contraste entre os momentos eufóricos e outros mais intimistas, alternando entre ambos em poucos segundos.
Para além do álbum mais recente, Phosphorescent foi ao baú buscar muitas músicas antigas. Um dos momentos da noite foi a velhinha Wolves, tocada só por Mathew na guitarra, com um final bem engendrado – o cantor pôs a voz em loop e foi acrescentando camadas, até parecer que havia na sala uma matilha de lobos.
No Lisboa Ao Vivo houve espaço para momentos de maior intimidade, como a belíssima Muchacho’s Song – balada de um trovador a braços com os revezes da vida, que tocou o coração da plateia.
Os músicos certamente não esperavam uma recepção tão calorosa, e sorriam, animados. A injecção de boa onda mútua foi de tal forma eficaz que o encore se prolongou por nove (!) músicas – um animado passeio pelo prodigioso repertório do cantor: entre outras, lembrámos A Charm/A Blade (tão antiga que Mathew se esqueceu da letra várias vezes), Los Angeles, These Rocks, e ainda uma cover da lenda country Robert Earl Keen, chamada Corpus Christi Bay.
O espectáculo encerrou com o balanço contagiante de Ride On/Right On, após o qual o cantor se despediu com um “até breve” entusiasmado. Esperaremos o tempo que for preciso, pois valerá sempre a pena ver este artista incrível. Mais do que um aperto de mão, Mathew Houck merece um abraço.
Setlist:
Black Moon / Silver Waves
Christmas Down Under
There From Here
My Beautiful Boy
Joe Tex, These Taming Blues
Tell Me Baby (Have You Had Enough)
Nothing Was Stolen (Love Me Foolishly)
At Death, A Proclamation
Muchacho’s Tune
Around The Horn
Dead Heart
Song For Zula
Encore:
C’est La Vie N.º2
Wolves
New Birth In New England
A Charm/A Blade
Los Angeles
Down To Go
These Rocks
Corpus Christi Bay (Cover)
Ride On / Right On
Promotora: Uguru
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