Era um projecto promissor ainda antes dos primeiros acordes: a guerreira punk Karen O, vocalista dos Yeah Yeah Yeahs, juntou-se ao multifacetado músico e produtor Danger Mouse para engendrar o álbum “Lux Prima” (2019, BMG). A intenção de trabalharem juntos não é nova: desde 2008 que os dois músicos falavam em colaborar num projecto, que agora se materializa neste disco.
O pontapé de saída é logo um tema épico – “Lux Prima” corre por 9 minutos e três segundos, construído como uma peça de joalharia – começa com sintetizadores, cordas e coros angelicais, a criarem um ambiente sinfónico e emocional; perto dos 3 minutos entra a percussão elegante e um baixo funky e, depois, a voz límpida de Karen O; o final regressa às mesmas texturas clássicas em caldo de psicadelismo. O resto é inspiração.
Ancorado em ambientes trip-hop, bandas sonoras vintage e linhas de baixo fanadas à soul clássica, o disco é um cocktail de luxo. Oscila entre um lado mais ambiental, sensual, quase neo-soul, e injecções de adrenalina rock, mas o conjunto resulta coeso – são como cenas diferentes de um mesmo filme.
Balada atmosférica e elegante, a sofisticada “Ministry” mostra o lado mais suave da voz de Karen O, que surge em grande forma em todos os temas – “Lux Prima” foi gravado depois do nascimento do primeiro filho da cantora, e tem uma brandura que ela atribui directamente a essa experiência.
E a produção? É de luxo, como não podia deixar de ser. O toque de Midas de Danger Mouse vê-se nos arranjos espaçosos, onde a clareza põe à vista os mais ínfimos pormenores instrumentais. O produtor sempre colheu inspiração das melhores referências, contribuindo para alguma da melhor música feita nos últimos vinte anos – Gnarls Barkley, Broken Bells, Gorillaz, The Shins, Beck, Black Keys e por aí fora.
Desde a vibração disco-sound de “Turn The Light” até à elevada amperagem blues-rock do intenso “Woman”, passando pelas piscadelas de olho a Morricone nas orquestrações cinemáticas, este duo dinâmico criou uma elegante utopia cósmica, onde apetece assentar arraiais.
A química entre os dois artistas é evidente, criando uma dinâmica invejável para uma primeira colaboração – “Lux Prima” é latim para “primeira luz”, um raio luminoso a rasgar a escuridão e, neste caso, poderá ser o início de uma brilhante (e produtiva) amizade criativa.
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