O músico Ruban Nielsen é tudo menos previsível. Ouvimos uma canção dos seus Unknown Mortal Orchestra, e não sabemos para que direcção fortuita irá ela virar-se. A cada novo álbum, o caleidoscópico som da banda tem vindo a tornar-se mais denso, mais carregado de ideias, camadas e texturas enoveladas.
“Sex & Food” (Jagjagwuar, 2018), quarto registo de originais editado em Abril, confirma a tendência. É uma viagem mágica com muitos apeadeiros: há doses generosas de solos cheios de fuzz (Nielsen é um ás da guitarra), uma produção cristalina, linhas de baixo cheias de pintarola soul e teclados coloridos de psicadelismo.
“A God Called Hubris” é a porta de entrada – uma intro vagarosa, feita de batidas de hip-hop fraturadas, que abre caminho à guitarrada muito Hendrix de “Major League Chemicals”. Aqui, a voz de Ruban, revestida de efeitos coloridos, encaixa na aparente confusão sonora com um encanto lo-fi muito particular.
“Ministry of Alienation” é o primeiro rebuçado r&b do disco: passada lenta, com a linha de baixo a seguir de mão dada com a guitarra em direcção ao groove. É um tema sensual, engatatão, uma balada alienígena cheia de ginga. Este lado mais suave está também presente na genial “Honeybee”, declaração de amor do músico à sua filha – e um dos temas mais orelhudos.
Há depois o choque da entrada demolidora de “American Guilt”, com um dos riffs do ano, tão eléctrico como se houvesse um cabo de alta tensão solto a faiscar no estúdio. É um tema furioso, mergulhado em distorção e energia, uma rockalhada old school em contra-corrente com os dias de hoje, em que o rock é visto como algo ultrapassado e inerte.
Curva apertada para a faceta funk, como em “Everyone Acts Crazy Nowadays” e “How Many Zeros”, a puxar pelos pezinhos para dançar. Na curva seguinte podemos encontrar o lado mais jazzy e narcótico de baladas como “Not In Love We’re Just High”, devaneio de sintetizador manhoso a fazer lembrar um esquecido lado B de Prince.
As frequentes curvas e solavancos podem provocar algum cansaço, mas há muito a admirar na riqueza desta manta de retalhos, sempre estimulante. Ainda assim, a intenção confessa de Ruban foi manter a simplicidade – ”tentei manter as coisas divertidas, fazer malhas que as pessoas possam ouvir no comboio a caminho do trabalho”, disse em entrevista à Noisey.
A fechar o disco há “If You’re Going to Break Yourself”, sentida balada acústica sobre amizades perdidas na selva dos vícios. De alguma forma, afinal, os Unknown Mortal Orchestra são previsíveis: estão melhores a cada novo disco.
Depois de terem actuado no NOS Primavera Sound no passado mês de Junho, os Unknown Mortal Orchestra regressam este mês a Portugal para duas datas:
29 Outubro: Hard Club, Porto
30 Outubro, Aula Magna, Lisboa
Promotora: Everything is New
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