É um objecto singular, o disco de estreia dos Delamotta, “La Ronda”. A banda de Setúbal é composta pelos irmãos João (percussão) e Gonçalo Mota (letras e voz), e ainda Bernardo Pereira (baixo e teclas) e Renato Sousa (guitarra). Os atributos deste disco mostram que falamos de músicos de qualidade, isso não se discute. O curioso é que cada tema parece apontar numa direcção diferente, o que faz com que o álbum tenha algo de colectânea. A viagem inicia-se com “Pambu Njila”, tema animado, com uma percussão muito jazzy e um registo influenciado pela música popular portuguesa (inclusive nos coros).
O tema seguinte, “Dona Lara”, abranda o ritmo e transporta-nos para uns Coldplay arraçados de Azeitonas. É uma canção serpenteante, que roda e roda com graça, até aterrar numa praia tropical a sul de copacabana. A voz tranquila denota alguma melancolia, sendo depois acompanhada por uma elegante segunda voz feminina.
Mudança de chip: o terceiro tema, “Treacherous”, cantado em inglês, mergulha no jazz salpicado de guitarras funky e percussão acelerada. A produção, a cargo de Sérgio Mendes, é irrepreensível (como aliás em todo o disco), atenta aos pormenores e bem misturada. O vocalista tem um lado muito pop-rock – a sua voz lembra a de Brandon Boyd, dos Incubus. O tema espraia-se, desaguando numa melodia próxima dos trabalhos mais recentes de Kamasi Washington.
(Clic) lá vai o chip – a delicada “Mesmo”, cantada em dueto com Cátia Mazari Oliveira, é uma canção simples de inegável beleza, e revela a costela brasileira do disco – ainda que seja (bem) cantada em português de Portugal.
“No Longe Demais (Prólogo)” é uma mais uma balada com jazz no ADN, mas com um coração pop bem plasmado no refrão orelhudo. “Gota a Gota” volta ao tropicalismo planante e sofredor, com a guitarra acústica como suave motor de arranque. Já “A Preto e Branco” cai no território de um Miguel Araújo que passasse uma temporada no Hot Clube.
(Clic) aí vai o chip outra vez – em “Losing Ground”, cantada em inglês, até há metais e um pouco de scat. Curva apertada em direcção ao terreno dos Radiohead, com “Circle of Beasts”, atmosférica e obscura balada em inglês, carregada de texturas de guitarra. O puzzle completa-se com “No Longe Demais (Epílogo)”, nova voltinha na guitarra acústica para um tema tranquilo com letra em português.
Observando cada peça isoladamente, há qualidade e musicalidade a rodos – na nossa opinião, resta apenas afinar o foco da banda, senão os Delamotta arriscam-se a não encontrar o seu público, com um som tão heterogéneo. Aguardamos com expectativa que rumo irá escolher esta sónica aventura setubalense.
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