O que terá levado Meg Remy e as suas U.S. Girls a colocar uma mulher a chorar como capa de um disco em 2018 é algo que se descobre com a audição das canções: “In a Poem Unlimited” (4AD, 2018) é um disco criado para ouvir com ironia apurada e uma disponibilidade para olhar, com sensibilidade, para questões colocadas por movimentos cívicos virados para o feminismo que, em 2018 e vestidos de “Femme Fatale”, ainda têm algo de substantivo a dizer.
Percorrendo o disco, à terceira canção deparamo-nos com “M.A.H.”, que lembra Madonna ou Debbie Harry no centro de uma pista de dança. Um tema que é o artefacto central do registo, em redor do qual vão surgindo acordes que trazem o acid jazz, o trip hop, as guitarras eléctricas e sintetizadores que se propagam no ar em espiral, bem como uma camada de metais que, tudo somado, transformam “In a Poem Unlimited” no disco mais acessível das U.S. Girls.
“Rosebud” recorda-nos de que estamos a ouvir um disco pop e, quanto a “Incidental Boogie”, aflora a distorção que Meg Remy nos trouxera em núpcias anteriores.
Havendo a possibilidade de não ser coerente com a boa sonoridade que preencheu “Half Free”, primeiro registo através da 4 AD editado nos idos de 2015, encontramos agora resquícios de riot grrrl, num disco onde a criação surge como forma de expressão digna de um movimento DIY dos nossos dias, com canções que questionam comportamentos masculinos na sociedade actual e uma narrativa de sentimentos que permanecem à flor da pele.
A sonoridade luminosa, alegre e pontualmente orelhuda não remove a camada introspectiva e reivindicativa ao registo, sendo essa a sua principal mensagem. Um conjunto de canções compostas por um misto de som e fúria, que justificam por completo o lacrimejar de que se reveste a capa do disco.
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