A dor de corno é, decididamente, um dos maiores motores da criatividade. Assim de repente e viajando através do hemisfério musical, ouça-se “The First Days Of Spring”, a magnífica rodela que os Noah and the Whale lançaram no ano de 2009, depois de o vocalista Charlie Fink e Laura Marling – que, para lá de namorada de Fink, era a menina dos coros da banda – terem atirado – pelo menos ela – com a relação às urtigas. O rapaz lá se compôs mas, infelizmente e musicalmente, os Noah nunca mais foram os mesmos.
Quanto a Ryan Adams, passou recentemente por um doloroso divórcio, algo que o deixou com o coração a precisar de muito mais do que fita-cola. O remédio – ou pelo menos o anestésico – que descobriu na farmácia lá de casa deu pelo nome de “Prisioner”, um disco que reúne doze canções sobre as dúvidas e incertezas do amor e da própria vida de Adams, o mais inspirado disco que o músico norte-americano gravou desde “Heartbraker”.
“Prisoner” é a banda-sonora perfeita para remendar corações partidos, acalmar dúvidas existenciais ou, simplesmente, aceitar que a escuridão estará sempre à espreita e que o melhor é convidá-la para beber um copo. No entanto, se os Noah and the Whale o fizeram a cortar musicalmente os pulsos, Ryan Adams encontrou uma forma gingona e celebratória de espantar a tristeza.
“Do You Still Love Me?”, o tema com que arranca o disco, é a pergunta retórica feita pelos amantes rejeitados e em estado de negação; em “Haunted House”, Adams caminha numa casa vazia, confrontando as memórias que saltam a cada esquina lembrando uma ausência difícil de preencher; “Doomsday” é, ao contrário do que o título poderá sugerir, uma canção alegre, onde se ouvem versos como “Can you stand and face your fears, my love? I will for you”; no tema “Shiver and Shake”, Ryan Adams veste a camisa de Bruce Spingsteen para falar do desconforto de ver um antigo amor na marmelada com outro. “To Be Without You” é uma daquelas canções de ir às lágrimas, onde se chega ao libertador mas tocante momento de aceitar que uma relação morreu e que o melhor é seguir em frente: “It’s so hard not to call you / Thunders in my bones out in the streets where I first saw you / When everything was new and colorful, it’s gotten darker / Every day’s a lesson, things were brighter before / Nothing really matters anymore”.
Espécie de disco de auto-ajuda, “Prisioner” mostra que, quando chegarem os tristes dias do infortúnio, o melhor é procurar bem fundo o amor-próprio, que nada mais é do que a Betadine com que se limpa as feridas antes do curativo e da toma de antibióticos.
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