Nos últimos anos, tudo por culpa do mister JJ, recuperou-se para o futebol alguns dos termos mais ligados às artes da patinagem, como sejam a “nota técnica” ou a “nota artística”. No caso da passagem d’ Os Capitães da Areia pelo CCB, mais concretamente em relação à prestação vocal de Pedro de Tróia, pode dizer-se que, se a nota técnica esteve uns furos abaixo daquilo que resultou no brilhante e irrepetível “A Viagem dos Capitães da Areia a Bordo do Apolo 70”, a nota artística, essa, ficou muito perto da medalha de ouro, resultando numa festa de se lhe tirar o chapéu onde, para além de uma pacífica e bem-disposta invasão de palco, houve ainda um comboio humano a percorrer o Pequeno Auditório do CCB.
Já antes do concerto, o prenúncio de um contacto extra-terrestre era algo de palpável no ar, com a projecção de estranhos vídeos e uns sons arrancados ao último disco da banda, daqueles que se ouvem em filmes de ficção científica ou, muito provavelmente, numa loja de recordações para os lados da base de Houston.
A banda entra em palco e dirige-se aos seus mini-pódios revestidos a lantejoulas, estando o microfone de Tróia revestido com um pano vermelho e branco que, quando desdobrado, tinha todo o ar de ser uma bandeira do país das baguetes. O concerto contou também com a estreia nos teclados de Tomás Gonçalo, que veio dar um ar mais orgânico a uma banda que tem, nos beats pré-gravados, uma mais-valia.
É com Pedro de Tróia a cantar lindamente em falsete e a tratar toda a gente por “você” que abre a pista de dança no CCB. “Nasci para enriquecer” dá início à festa e são já audíveis as palmas, a vontade de um coro imenso e a decisão de sair das cadeiras para abanar as ancas e o corpinho todo. E, se nas palavras de António Moura este iria ser um concerto “doce, especial e romântico”, a isto se juntou a pura celebração, como quando “A Partida para o Espaço” soa a música de baile espacial para saborear em gravidade zero.
E, se há momentos menos conseguidos como a cover de “Sempre que o amor me quiser”, de Lena d`Água, “Dezassete Anos”, do primeiro disco da banda, roça o épico, com todo o auditório a fazer a festa e, tomando à letra as palavras de Pedro Tróia, a não ter medo de ser ridículo.
Tendo dado à música portuguesa um dos seus mais estranhos, juvenis e incríveis discos dos últimos dez anos, Os Capitães da Areia mostraram esta noite que a música é um lugar de celebração e de festa, de libertação das formalidades e das máscaras que cada um vai vestindo todos os dias.
Depois do encore, a banda abandona o palco e o público, durante uns minutos, entoa brava e sonoramente “quero pão com marmelada”. Só faltaram mesmo as travessas a passar de mão em mão para que a viagem espacial tivesse atingido o ponto da velocidade-luz. Bravo, Capitães! – apetece gritar de boca cheia.
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