Tal como acontece com a Literatura, também na Música há concertos que, no lugar de parágrafos longos e páginas cheias de alto a baixo, usam versos curtos e perfumados que se olham como quadros e que, mais do que a sua interpretação partilhada, pedem antes uma serena introspecção. Foi assim com o concerto do francês Quentin Sirjacq – 19 de Março n`O Bom O Mau e O Vilão, Lisboa -, pianista que, após a primeira visita com o projecto Dakota Suite, regressou a Portugal para os seus primeiros concertos a solo.
De costas para o público e tratando de esquecer os barulhos constantes de passos, copos a tilintar, gelo a ser servido e risos deslocados, Quentin viajou entre um passado bem composto e os temas do novíssimo “Far Islands And Near Places”, que alia o lado clássico da composição a discretas pinceladas electrónicas. Quase sempre de olhos fechados e sem recorrer a qualquer pauta ou memória escrita, Quentin sentou-se num banco que rangia com a sua postura rectilínea, convidando a chuva – mas sobretudo o mar – a entrar porta adentro.
Há notas que parecem pequenas ondas, que vão trazendo conchas para a areia ou embalando os peixes num sono tranquilo. Outras vezes – mais raras – há tensão no mar alto, onde por entre tempestades piratas vão ensaiando a acostagem a barcos que decidiram, sabe-se lá porquê, ser mais atrevidos numa noite em que deviam ter ficado em casa. Não será certamente estranho evocar a imagem daquele piano à beira-mar, no célebre filme de Jane Campion, uma vez que a música de Quentin transporta em si todo o encanto da paisagem marítima, da chuva incessante, assentando na perfeição o título escolhido para o seu mais recente e muito recomendado trabalho: “Far Islands And Distant Places”.
“A maior parte da minha música é trágica”, disse a certa altura Quentin, numa das muitas ocasiões em que entre músicas tratou de trocar algumas palavras com o público, agradecendo a presença mas, também, o silêncio. “Acho que a música fala por si”, disse ainda como que mostrando que estas músicas, mais do que serem espremidas em palavras, se destinam a ser bebidas como versos apaixonados.
A boa notícia é que Quentin Sirjacq estará de volta a Portugal no próximo mês de Novembro, regressando aí com o projecto Dakota Suite. Palavra final para a Pinuts que, com apenas um ano de existência mas muito trabalho de casa, tem conseguido apresentar propostas musicais verdadeiramente interessantes e de um saudável ecletismo.
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