Se Paul McCartney tivesse levado uma tampa de Linda no auge da sua paixão, provavelmente teria gravado um disco muito parecido a “Goon“, a estreia de Tobias Jesso Jr. no mundo dos longas-duração.
Não será necessário efectuar uma grande pesquisa nas enciclopédias musicais para constatar que, normalmente, é quando se metem os dois pés dentro de um buraco negro que surgem discos de se lhe tirar o chapéu. “First Days Of Spring”, dos Noah and the Whale, ou “For Emma, Forever Ago”, de Bon Iver, são apenas dois exemplos de como um coração miserável está, vá-se lá perceber, ligado à criação divina.
Tobias, porém, não ganhou a sua entrada num buraco negro por uma paixão que correu mal – talvez uma parte. No seu caso, o chegar ao fundo coincidiu com uma série de acontecimentos, como ser atropelado por um Cadillac enquanto passeava de bicicleta, falhar rotundamente enquanto escritor fantasma de canções pop e descobrir que a sua mãe tinha um cancro.
Quando todos estes astros se alinharam – no pior dos sentidos -, Tobias guardou os instrumentos na arrecadação e regressou à sua casa de infância em Vancouver, no longínquo Canadá. Foi aí que se sentou no velho piano da sua irmã, no qual nunca havia deixado uma única impressão digital. Nem neste ou em qualquer piano, isto se não contarmos com as brincadeiras musicais da infância.
Tobias tornou-se assim – e ao mesmo tempo – professor e estudante, tentando perceber como funcionavam aquelas 88 teclas bi-cromáticas. E, se este canadiano de 29 anos não é propriamente um pianista ou músico prodigioso, no que diz respeito à escrita de canções a conversa já será outra, fazendo uso de uma pureza e simplicidade que já vai sendo raro encontrar no mundo artístico, seja ele musical ou de outro qualquer universo criativo.
O universo lírico expresso em “Goon” recria as vivências e o falhanço de Tobias na sua passagem por Los Angeles, onde não faltam as críticas à falsidade de Hollywood e mulheres que adoram vê-lo chorar ou, simplesmente, que não o aceitam de volta (ou já o trocaram por outro).
Quanto ao universo musical é impossível não pensarmos nos Beatles, ainda que Tobias não retrate a tristeza da forma tão alegre ou dissimulada como o fizeram os fab four. Mas nem poderia ser por aí, já que este é um território habitado pela contenção. Há pianos, guitarras e cordas – sobretudo de violinos -, num disco que, na sua aparente calma, esconde raízes bem enterradas no território folk/rock.
Produzido por Chet “JR” White – dos extintos Girls -, Patrick Carney – umas das metades dos Black Keys -, John Collins – dos The New Pornographers – e Ariel Rechtshaid – uma espécie de produtor da moda -, quarteto que teve o mérito de não desvirtuar o classicismo, a simplicidade e a ternura que são palpáveis numa dúzia de canções, “Goon” é um disco que não pertence a qualquer tempo ou lugar e que conta histórias que, de tão pessoais, se transformam em hinos universais de solidão, perda e isolamento. Por muito que nos misturemos com o mundo, de certa forma estaremos sempre sozinhos. Uma estreia triunfal.
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