Num dia de enchente, onde a dado momento parecia estar a decorrer uma convenção do ramo imobiliário frente ao Palco Comédia, os Pearl Jam assinaram um senhor concerto. O grunge já era, mas a banda de Seattle sempre viveu num bairro só seu. Seguem-se três postais Alivianos, em jeito de despedida. Venham de lá as primeiras confirmações para 2025 (10 a 12 Julho). Por aqui, pedimos Billie Eilish. E vocês?
Foi à hora do chá que Catarina Branco, uma das pontas de lança dessa equipa-maravilha entre a Maternidade e a Cuca Monga, se apresentou no Palco Coreto, alternando entre os teclados e a viola para um set que só pecou pela brevidade: 19 minutos. Na bagagem, um álbum e alguns EP`s, onde se fala de coisas tão essenciais quanto pokémons, cintalhos (strap-ons, em bom inglês), a necessidade de uma boa hidratação, a importância da nutrição ou a chatice que é ter de mudar os lençóis da cama. Foi curioso ouvir estas versões em estado quase larvar, longe do resultado final das gravações, como se estivéssemos a jogar um sudoku imaginário. Ganhou de certeza novos ouvintes.
“Isto vai ser Rated R”. O aviso surge pela boca de Izzy Bee Phillips, vocalista dos Black Honey, que se apresentou em palco numa versão pós-millenial do Capuchinho Vermelho. Se os Pixies não tivessem finado há alguns anos (pelo menos criativamente), poderiam bem soar como esta banda de Brighton, que mistura com esmero pop selvaticamente cinematográfica com um rock envolto em negrume, comandado por uma voz que evoca uma Hope Sandoval após despachar uma bandeja de shots. Canta-se sobre depressão, culpa, ansiedade social, traumas ou pesadelos, mas tudo sem ponta de flagelação ou desânimo – antes com a catarse no horizonte que está mesmo ali à mão. Aquela ponta final em que Izzy pede para que as raparigas se cheguem à grade, para depois descer num tocante momento de confraternização, foi tão punk que doeu. Por aqui, fica o pedido: tragam os Black Honey em nome próprio ao Lisboa ao Vivo.
Os Pearl Jam são, com as devidas diferenças, a Taylor Swift dos quarentões e cinquentões cá do burgo: assim que surge a confirmação de um concerto da banda norte-americana, os bilhetes desaparecem como pãezinhos quentes. Afinal, coube-lhes esgotar com a devida antecedência o dia de fecho do NOS Alive, e foi grande o receio quando, há poucas semanas, a banda cancelou alguns dos concertos europeus por motivo de doença, não avançando com mais pormenores. Em Algés, os sobreviventes do finado movimento grunge – do qual sempre foram um satélite com órbita própria -, entraram com tudo e saíram em ombros, mostrando que nem só de saudosismo se faz a sua história – os novos temas são bons e recomendam-se.
Fazendo do Duolingo uma escola de línguas para meninos, Eddie Vedder atirou com os “olás” e “obrigados” às urtigas para ler, por várias vezes, textos com o embalo de uns Maias, nem sempre fáceis de perceber – idas à praia ou o amor eterno por Portugal foram tema. Porém, mesmo em inglês se notaram alguns problemas com a dicção de Vedder, fosse para falar das eleições americanas – “I hope it`s a healing election” -, ou da mania de escolherem, enquanto jovens adultos, nomes curtos para as canções – “Alive”, “Animal”, “Release”, “Daughter”… e agora “Reckage” -, sendo fácil de especular que “os motivos de doença” terão passado por ele. Problemas que não se reflectiram no cantorio deste concerto avassalador, que começou com “Daughter” a ser gritado em coro, viajou entre os muitos clássicos e novas malhas, incluiu um cover de arrepiar de “Imagine” ou aquela versão de “Rockin in a Free World” que incita ao mosh – avistámos alguns fogachos. Mike McReady permanece um mestre da guitarra, com solos à vista ou atrás das costas de fazer inveja , e Cameron a sovar a bateria com esmero. They are still alive, há que dizê-lo.
Fotos
Guilherme Cabral (Catarina Branco)
João Silva (Black Honey)
Hugo Macedo (Pearl Jam)
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Promotora: Everything is New
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