Como outras incontáveis bandas, os Loosense nasceram numa garagem. Aconteceu ali para os lados de Setúbal, corria o ano de 2014. Formaram-se a partir da cumplicidade musical entre Pedro Nobre e Diogo Costa, dois amigos de liceu com uma paixão comum pela música.
Ao longo do tempo construíram um colectivo singular no apertado espectro do jazz nacional, juntando vários músicos às suas fileiras. Este ano editaram o segundo álbum, “Saloon” (Loosense, 2019), agora com 10 músicos no alinhamento. Ou seja, por trás do nome Loosense há uma considerável força musical.
A sonoridade habita nos terrenos do jazz instrumental, mas é bastante fluída: tanto explora o groove suado e o funk sedutor como descreve, por vezes, curvas apertadas em direcção às guitarras frementes do rock, com passagem pelos ritmos latinos, o psicadelismo e as percussões vanguardistas – uma festa.
Entramos então no “Saloon” destes dez amigos pelo primeiro tema, que se desdobra num tríptico: “Capitol I” entra de mansinho, tranquilo, pelas cordas de uma guitarra dedilhada e de um piano sereno. Aos poucos vai-se tornando tenso, fazendo lembrar os ambientes opressivos de “Blackstar”, o último registo de Bowie. Lá pelo meio há um piano cristalino, suportado por uma percussão inventiva e dinâmica, viajando pelas paisagens desoladas que os Radiohead exploraram em “Ok Computer”.
O segundo andamento, “Capitol II”, carrega no acelerador com um ritmo contagiante que desagua num improvável solo de guitarra flamenca, tocado pelo guitarrista convidado Marco Alonso. “Saloon” está cheio de surpresas como esta, ideias musicais improváveis que resultam em temas criativos e arrojados.
“Capitol III” encerra a trilogia: seguimos por um desvio na noite, uma estrada perdida na América profunda, com uma guitarra saída de Twin Peaks – uma dança sensual com um sintetizador subterrâneo. Com “Flamingo” viramos para um groove vibrante, de abanar o pézinho – os Loosense também sabem construir ambientes festivos e convertê-los em jazz fumarento, com um golpe de asa subtil.
“Dabox” organiza-se em torno de uma frase de guitarra, erigindo aos poucos um edifício jazzístico imponente. Já “Tokyo” começa com uma percussão minimal, antes de enveredar por um longo corta-mato psicadélico, cheio de ambientes tropicais, ritmos pulsantes e interlúdios atmosféricos. Temas como “Taifa” e “Villain” revelam um colectivo unido por uma ligação musical telepática, onde a percussão inquieta e balanceada comanda muitas vezes as operações.
“Saloon” é um disco ligado à faceta mais actual do jazz de fusão, que tem os seus heróis em Kamasi Washington, nos BADBADNOTGOOD e em Shabaka Hutchins, entre outros. Longe de ser bafiento e reverencial, é um disco sem receio de evoluir para onde lhe dá na real gana – sempre sem perder de vista o prazer do ouvinte.
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