Depois de uma década inteira e metade de outra dedicados de corpo e alma aos Efterklang, os dinamarqueses Claus Casper, Mads Christian Brauer e Rasmus Stolberg decidiram, há coisa de três anos, que era tempo de mudar de nome e de paisagens sonoras.
Juntamente com o baterista finlandês Tatu Rönkkö, e aproveitando uma residência na Finlândia, inventaram uma nova banda a que deram o nome de Liima. Banda que manteve o lado sinfónico e etéreo dos Efterklang, mas acrescentando-lhe uma electrónica um tudo ou nada mais visceral, mais carnívora.
A estreia da banda no formato longa-duração deu-se em 2016 com “ii” e, já no ano passado, foi a vez de “1982”, disco que contou com a produção de Chris Taylor, músico dos Grizzly Bear, que ajudou a moldar este disco de certa forma conceptual sobre a memória e aquilo que poderemos fazer para que esta se transforme, mais do que em nostalgia ou recordação, em matéria viva do presente. Um disco que acompanha as muitas transformações da sociedade moderna, sobretudo na forma como a tecnologia veio alterar as relações sociais, dotando-as de uma proximidade artificial.
Se olharmos para o título de algumas das canções que compõem esta nova rodela, encontramos nomes tão ligados ao imaginário dos anos oitenta quanto “David Copperfield”, o incrível mágico americano, ou “Kirby’s Dream Land”, nome de um jogo de consola – ainda que este tivesse rebentado já nos anos 90 – onde Kirby, um residente na Dream Land, tentava recuperar a comida roubada pelo Rei Dedede. Musicalmente, pressentem-se melodias que teriam caído que nem ginjas em bandas tão distintas quanto os Cars, os Depeche Mode ou os Roxy Music. Mas sempre de olhos postos na frente, levando o retro às cavalitas para um passeio revigorante.
“Sempre nos sentimos atraídos por uma certa melancolia, mas é como chorar enquanto sorrimos. Não nos interessa o que é demasiado alegre e luminoso, unidimensional. Procuramos a linha ténue entre um sentimento e o outro. É esse equilíbrio que procuramos. Nesse sentido, este álbum, apesar da melancolia, é esperançoso. Mas esperançoso de uma forma compreensiva, consciente de onde vimos”. Declarações de Claus Casper a Mário Lopes (recomenda-se vivamente a leitura do artigo/entrevista aqui), que mostram que a banda faz da melancolia um momento de festa, um estado emocional que pôde ser comprovado na passada quarta-feira (21 Março) na ZDB, o aquário musical mais recomendado da cidade de Lisboa.
Começámos a viagem assistindo a um pôr-do-sol de cerveja na mão, enquanto os sinos iam anunciando o fim da jornada. Assistimos da primeira fila a um passo de magia de “David Copperfield”, ganhando ânimo antes que à cara nos fosse atirado que a “Life is Dangerous”, um dos temas mais belos de “1982”, onde Claus, por diversas vezes, bate com o punho fechado no peito, sempre entre sorrisos, confidenciando que este se trata de um espectáculo especial, pedindo que se atire um olá aos seus amigos que esta noite marcaram, presença. Claus que, desde há alguns anos, trocou o norte da Europa por Lisboa, cidade que lhe tem servido para alimentar a criatividade, tanto no universo dos Liima como no alter-ego Captain Casablanca.
“2 Hearted” é-nos servido em modo Daft Punkiano, enquanto em “Jonathan, I Can’t Tell You”, depois de os passarinhos passarem em vôo rasante e de um assobio que poderia ter sido emprestado por Andrew Bird, se faz um coro colectivo em nome de uma masturbação envergonhada.
Não falta o hino “1982”, já com Claus vestindo uma indumentária própria de quem vai dar um mergulho ao Tejo, “Trains in the Dark”, uma das primeiras canções escritas pela banda que parece querer trazer de volta o drum `n` bass de Roni Size, ou “Black Beach”, escrito pelos Liima durante uma visita à ilha da Madeira, que recorda a vertigem feliz dos Animal Collective. Antes de tudo isto tocou o já clássico “Amerika”, onde Claus se passeou por entre o público com uma lanterna que fez dele um mineiro em busca de pedras e emoções humanas.
A despedida faz-se junto do palco ao som de “The Winner Takes It All”, dos eternos Abba, e a verdade é que os Liima, num concerto que teve momentos de electrónica apontada à pista de dança, rock para fazer ondular o cabelo, pop tão delicada como um novelo de algodão doce, levaram para casa todas as taças que estavam em jogo. Ou, fazendo apelo à piada alcoólica fácil, com Liimas desta nunca nos hão-de faltar caipirinhas.
Fotos gentilmente cedidas por ZDB/Vera Marmelo.
1 Commentário
Foi sem dúvida um belo concerto! ☆☆☆☆☆