O cantor e produtor americano Jonathan Wilson percebeu, na sequência do fabuloso disco “Rare Birds”, de 2018, que levara o seu som panorâmico de inspiração retro à sua máxima expressão. Desdobrou então o poeirento mapa da América e traçou azimutes em direcção a Nashville, capital da música country. A ideia era fazer um disco de regresso às raízes – o músico cresceu imerso em música country e bluegrass, na Carolina do Norte.
Lá chegado, fechou-se num estúdio com um punhado de músicos históricos do country, e saiu ao fim de seis dias com o novo “Dixie Blur” (Bella Union, 2020). O vertiginoso processo de gravação foi bem diferente do de “Rare Birds”, construído pacientemente e peça a peça ao longo de meses.
O que ressalta deste novo trabalho é, de facto, a inflexão no registo. Wilson lança amarras na música country, esquecendo as constantes mudanças de direcção que fizeram de “Rare Birds” um objecto surpreendente. Outra diferença está na gravação ao vivo com banda, em contraponto com o trabalho solitário e laborioso do disco anterior.
“Dixie Blur” é menos original do que o álbum que o precede, menos imprevisível, soando inicialmente como mais formulaico. Ao fim de algumas audições, no entanto, destacam-se as mudanças de velocidade e apontamentos sonoros que abrem clareiras de beleza no meio dos arranjos. Depressa vamos do blues sonhador e atmosférico para o country tipo banda sonora de feira de gado do Alabama, e vice-versa – veja-se, por exemplo,” Riding The Blinds” ou “So Alive”.
A produção, desta feita a cargo de Pat Sansone, dos Wilco, tem mão segura em todas estas variações de atmosfera, revelando por vezes verdadeiras pérolas – como por exemplo o trecho final de “Platform”, com instrumentos de sopro.
Wilson dispõe de um grande talento para a melodia, e continua um compositor excelente, capaz de emocionar. Prova disso são temas como a belíssima “69 Corvette”: o músico recorda a infância e os pais com uma voz serena que lembra a de Mark Knopfler. É uma canção comovente, ainda mais se for vista em conjunto com o vídeo, que inclui velhos filmes caseiros de Wilson. Percebe-se que este é um conjunto de canções muito pessoais, com um tom autobiográfico, onde o músico consegue um registo perfeitamente alinhado entre o bom gosto e a comoção.
Em alguns temas entra-se intencionalmente no terreno da coboiada: o violino de Mark O’Connor e a pedal steel guitar de Russ Pahl ganham protagonismo em canções que misturam o psicadelismo cósmico de Wilson com texturas tex-mex, resultando num som coeso. “Oh Girl” é um bicho diferente: poderia ser uma música de Elton John. O piano está bem à frente na mistura, e a voz de Wilson cada vez mais apurada.
“Acho que nunca estive tão terra-a-terra e emocional, tanto musical como liricamente”, declarou Wilson à Rolling Stone acerca deste disco. Não podemos deixar de concordar. “Dixie Blur” reduz a escala grandiosa de “Rare Birds”, mas não reduz de forma alguma o talento de Jonathan Wilson. Este novo som assenta-lhe como uma luva.
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