Foram cerca de dois anos a trabalhar para uma dúzia de canções com alma e roupas de saltimbanco, que resultaram num disco intitulado “The Baron In The Trees” – título sacado a um livro do escritor Italo Calvino. O Deus Me Livro colocou algumas questões a Bartholomew Ryan, vocalista e guitarrista dos The Loafing Heroes, quando estamos a poucos dias – 6 de Maio – do lançamento da nova rodela no Musicbox.
Folk, world music, pop, há um pouco de muita coisa dentro deste “The Baron in the Trees”. Como definirias o estilo musical dos Loafing Heroes se tivesse mesmo de ser?
A sonoridade e o estilo musical da banda vão do folk irlandês e americano à música ambiente dos anos 70, do indie contemporâneo às canções dos trovadores.
Vocês parecem uma espécie de jogos sem fronteiras musicais. De que forma funciona o processo criativo à distância?
Algumas vezes tem mais nacionalidades (Portugal, Irlanda, Itália, Estados Unidos, Alemanha, Bulgária) do que membros efectivos! Somos três ou quatro que vivem em Lisboa e ensaiamos regularmente; a Jaime e a Judith, que moram em Berlim, juntam-se para concertos importantes e para gravar. Isto funciona porque elas são músicas virtuosas (violino e clarinete baixo) e conseguem adicionar as suas partes posteriormente. Por um lado, às vezes é difícil encontrarmo-nos todos para ensaiar, mas por outro lado a multi-nacionalidade é o que traz à banda influências e experiências diferentes e multifacetadas. O elemento essencial é o fluir constante de um conjunto de pessoas que, além de uma banda, pode ser considerado um projecto.
As letras estão povoadas de vagabundos, ciganos e saltimbancos, só faltam mesmo os piratas. Fascina-te este lado nómada e algo descomprometido perante a existência?
Sim, acho que é muito importante, especialmente hoje em dia em pleno século XXI: a época da informação,da tecnologia e de uma vida tão rápida. A ironia da nossa geração é que temos mais coisas e mais liberdade do que nunca, mas ao mesmo tempo não temos tempo para nada nem a capacidade de nos concentrarmos com calma sobre as coisas importantes da vida. Com este “The Baron in the Trees” – e cantando sobre vagabundos -, tentamos continuar com a tradição dos cavalheiros errantes, dos flâneurs e dos poetas do modernismo.
Sendo escritor, o João Tordo não fica chateado por não ser ele a escrever as letras?
Ha ha! Não, porque é uma tarefa diferente. Escrever letras para canções e escrever romances são duas coisas muito diferentes. Não sou capaz de escrever romances, mas estou muito confortável em escrever canções e poesia. E também as letras da banda são quase todas (ainda) em inglês, a minha língua materna. Acho que o João gosta muito de tocar o contrabaixo – e algumas vezes a guitarra – e criar música na banda em vez de escrever letras – é uma pausa saudável da vida de escritor e, também, uma outra maneira de criar.
De onde nascem as histórias dos Loafing Heroes, e onde é traçada a fronteira entre ficção e realidade?
As histórias e a inspiração vêm das nossas experiências de vida, das viagens em lugares reais e imaginários, e da nossa observação lateral do mundo. Também vêm das conversas criativas com poetas e filósofos do passado. Há muitas canções que se referem mesmo à realidade, como “God’s Spies” e “Nightsongs”, e outras que vêm de um universo de alegorias e símbolos, como “Gypsy Waltz” e “Loyal to Your Killer”. Mas estamos sempre a viver entre a ficção e a realidade: o sujeito e o humano são uma pluralidade.
Neste disco usas também múltiplos registos vocais, como se fosses vestindo a pele de cada personagem conferindo-lhe uma voz diferente. De onde vem esta mutabilidade vocal?
Ah, não sei… Não penso muito sobre isto. E gosto de não pensar muito sobre isto (para não perder a Musa). Canto como me sinto dentro de uma canção, e a maneira de cantar tem uma relação com as letras. No início as canções eram compridas e havia muito espaço para cantar com vozes diferentes e jogar com palavras. Depois, tornámos as canções de 10 minutos em canções de 3 ou 4 minutos, para chegar à essência. E agora há mais variedade também, porque Giulia canta na voz principal em duas canções no novo álbum, e também o resto da banda canta um bocadinho – então é mais divertido gravar discos!
Como foi trabalhar com o produtor Tadklimp, e de que forma contribui este para aquele que é, muito provavelmente, o vosso melhor disco?
Foi fantástico. Para nós Tadklimp é o produtor perfeito para gravar um disco: é um grande músico e produtor, gosta muito das nossas canções e da nossa visão, tem muita paciência e é uma pessoa muito calma. Ele ajudou-nos nos arranjos das canções e, também, em torná-las mais sintéticas: o resultado é que o novo disco é mais focado. Tadklimp é uma espécie de Brian Eno (do qual gostamos muito), e contribuiu nos sons ambientes de algumas canções, que foram muito importantes para o som final do álbum.
O que nos podes contar sobre o concerto de apresentação do disco, que acontece a 6 de Maio no Musicbox?
Vai ser uma grande noite! Vamos tocar todas as canções do novo disco, que é um álbum orquestral e cheio de cores devido aos vários instrumentos presentes – tais como o piano, o violino, o clarinete baixo, contrabaixo e a concertina. Vamos cantar sobre os temas da morte, da vida errante, do amor perdido e da regeneração. A seguir ao concerto a Giulia vai passar música como DJ CatNoir. Normalmente ela toca (entre outros) no Clube Incógnito. Então, vai ser uma noite com nova música, amigos e danças.
Para terminar: por que raio decidiu o barão subir à árvore?
Ha! ha! Pois… Este romance é uma alegoria tão bonita contada pelo Italo Calvino. Subir ao cimo da árvore e abandonar a sociedade ‘normal’ é uma forma de subversão ou rebelião à nossa época, focada no materialismo e na rapidez das coisas. Adorámos este titulo para a nossa capa, pois representa a ideia e o estilo da banda. O protagonista (o barão) decide subir a uma árvore e nunca mais descer, para não ter de viver uma vida hipócrita com valores que não partilha. O barão mostra a possibilidade de viver uma vida singular e cheia de aventuras surpreendentes.
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