De uma maneira ou de outra, a tradição folk anglo-saxónica tem sobrevivido bem à voracidade das épocas e à inconstância das manias, integrando-se transversalmente e com profundidade melódica em fenómenos de vastidão antípoda como os The Magnetic Fields do fim de século XX, os Wilco do princípio do século XXI ou os Manchester Orchestra de agora.
Apóstolos desta seita prolixa e interminável, os Bear’s Den lançaram no fim de 2014 um primeiro trabalho que soa como um décimo sexto. Maturo, parcimonioso mas quase fundamentalista na obsessão com as harmonias, carregado com um conjunto de poemas inspirados e convenientemente sorumbáticos, “Islands” (Communion Records, 2014) é um disco que deixa outras bandas menos convictas da sua inerente herança folk, como os The Lumineers, a milhas de distância, no caminho da floresta.
Logo no primeiro minuto de “Agape”, o tema de abertura, está uma espécie de manifesto. Se o gentil leitor ouvir apenas estes acordes iniciais ficará razoavelmente informado sobre a odisseia que os três músicos de West London têm para lhe propor. Um tema forte como o raio.
“The Love You Stole” transporta algo dos paleolíticos Big Country para uma redefinição da balada. Saltando de uma viagem psico-revivalista a Pompeia (“Above The Clouds Of Pompeii”), para uma trova de gentil-homem que evoca com brilhantismo algumas experiências sónicas do grande Stephin Merritt (“Isaac”), o audiente é confrontado mais à frente com o poder épico de “Think of England”, uma canção que dá vontade de apanhar imediatamente uma boleia do Mayflower ou qualquer coisa aventurosa e marítima deste género. O banjo, que é a peça lírica por excelência dos Bear’s Den, tem reinado até aqui mas, aqui chegados, é imperador.
Em “Magdalene” já estamos completamente imersos pelo arvoredo do folclore celta e, no trilho sombrio que se estende entre “When You Brake” e “Elysium”, ficamos cada vez mais próximos do grande deus-urso. O disco vai num crescendo indie-folk assumidíssimo, quase sem rock nenhum, até ao apogeu estético que os seus ouvidos, paciente leitor, vão consumir com deleite. “Bad Blood” é o fim do trilho, o triunfo do mato, o covil de todas as coisas. A razão da música no coração da floresta.
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