Em 2006, Spike Lee assinava “Inside Man” – “O Infiltrado” na tradução portuguesa -, um thriller cinéfilo protagonizado Denzel Washington, detective com olho clínico, e Clive Owen, um assaltante com uma imaginação fora de série. Centrado num assalto a um banco, trocava as voltas ao espectador durante pouco mais de duas horas, com um final que pedia uma ovação de pé.
“Um Animal Selvagem” (Alfagura, 2024), o mais recente thriller do suíço Joël Dicker, tem um certo toque da atmosfera de O Infiltrado, sobretudo no jogo que faz entre o passado e o presente próximo e mais distante, mas acaba por estar mais perto de uma telenovela mexicana do que de um mistério capaz de surpreender.
No centro da trama estão dois casais: Greg e Katrine, que caminham como funâmbulos no arame matrimonial; e Arpad e Sophie, a dupla que tanto Greg como Katrine invejam – cada um à sua maneira -, não hesitando em trocar de lado caso a oportunidade surgisse. A verdade, porém, é que como em todos os casais – e vidas – há segredos e mentiras guardados em cofres ou dentro de livros, e é nessa revelação em lume brando que Dicker vai tecendo a narrativa, entre o espírito voyeur, a necessidade de uma vida dupla ou as obsessões que podem atirar-nos ao tapete.
Talvez Joël Dicker nos tenha habituado mal com “A Verdade Sobre o Caso Harry Quebert”, livro que lhe abriu a porta ao estrelato e cuja qualidade e assombro não mais conseguiu igualar. É certo que “Um Animal Selvagem” está a milhas desse desastre chamado “O Desaparecimento de Stephanie Mailer”, mas Dicker continua a desenrolar cordel como se fosse um gato destrambelhado, ficando a quilómetros do clima cinéfilo construído com os Goldman entre Baltimore e Montclair.
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